– Clarisse Machanguana, antiga basquetebolista, hoje envolvida na luta contra o HIV/Sida
É uma figura de prestígio do basquetebol nacional. Apartou-se das lides desportivas e, actualmente, engaja-se na luta para “promover comportamentos saudáveis nos adolescentes e jovens”, numa altura em que o HIV/Sida continua a ser um desafio para a saúde pública no país. Através da fundação que leva o seu nome e, contrariando todas as expectativas, declarou que ser treinadora ou dirigente não faz parte dos seus encantos.
domingoentrevistou-a para se inteirar do trabalho da Fundação Clarisse Machanguana. Trata-se de uma entidade assente em pilares como a educação, saúde e desporto. No seu desempenho “abraçamos causas de jovens, implementando actividades que facilitam o seu crescimento de forma saudável e preparando-os para os desafios da vida”, referiu.
Antes mesmo de dar um impulso sob o ponto de vista económico, o trabalho de Clarisse e parceiros cultiva a auto-estima nos adolescentes e jovens essencialmente para “terem atitudes correctas e correrem atrás dos seus sonhos”, alinhando-os noshorizontes que promovem a saúde psíquica e, à mesma medida, a física, fundamentais para o despiste e/ou controlo de grandes enfermidades como o HIV/Sida, entre outras mazelas.
Este ano, a fundação lançou a campanha “Saber é Viver” e percorreu 7 províncias de Moçambique, tendo abrangido 31 distritos, 36 escolas secundárias e coberto um universo de aproximadamente 25.000 estudantes e 90.000 pessoas nas comunidades.
“Saber é Viver” foi financiada pelo Governo dos EUA, através do projecto PEPFAR, e está focada na necessidade de “sensibilizar as pessoas a conhecerem o seu estado serológico e, caso se mostre necessário, entrarem em tratamento”.
Entretanto, segundo referiu a presidente, urge, por intermédio destas actividades, desvelar o mito segundo o qual “HIV/Sida é só problema dos adultos, conforme tem sido o entendimento de vários adolescentes e jovens”.
Com as actividades promovidas no âmbito da referida campanha, pretende-se contribuir para uma geração livre desta doença, tudo feito em parceria com o Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH), o Ministério da Saúde (MISAU), Ministério da Juventude e Desportos (MINJUD), ao nível estatal, e com instituições que trabalham na área de saúde dentro das províncias, como a Centre for Disease Control and Prevention, CCS (Inhambane/Maputo Cidade), Ariel Glaser (Cabo Delgado/Maputo), entre outras.
JOVENS NÃO SE PREVINEM
A antiga jogadora denunciou comportamentos sexuais desviantes que, na sua óptica, contribuem para a preocupante incidência do HIV/Sida. “A informação que me chega refere que os jovens têm uma conduta que leva a esta doença. Não fazem nada para se prevenir”.
As consequências, conforme vaticinou, serão nefastas: “Os governantes de hoje serão substituídos por uma geração doente. Outro aspecto preocupante são os números altos que envolvem crianças infectadas pelos pais, com o agravante de que não recebem essa informação dos seus progenitores, isto é, crescem sem ter conhecimento de que estão infectadas, sendo que tomam medicamentos sem saber para que efeitos”, censurou.
TRABALHO A LONGO PRAZO
A campanha “Saber é Viver” decorreu durante dois meses, na sua primeira fase. O balanço é considerado positivo “por termos conseguido prender a atenção dos jovens na necessidade de olhar para o HIV/Sida como um problema de grandes dimensões”. Clarisse considerou que a adesão foi “fenomenal”, porém admite que as acções realizadas não foram suficientes para provocar mudanças notáveis. Por tal percebe a necessidade de “continuar no terreno, fazendo com que sejam replicadas pelos jovens no seio das comunidades, dentro das famílias”.
Este é um trabalho para as massas, “não depende só de nós, deve haver acções conjuntas”. A meta é contribuir para a redução dos índices, sendo que “queremos ser a voz e o rosto do bem-estar físico e psíquico dos jovens”.
E várias são as estratégias aplicadas, entre elas,“jogos interactivos e/ou teatro na língua local para demonstrar aos adolescentes e jovens como o indivíduo é contaminado”.
NÃO É PROBLEMA
DE PROSTITUTAS
Falar cada vez mais de forma aberta sobre a doença tem sido uma plataforma acolhida e implementada em campanhas de sensibilização.
Na “Saber é Viver” são, também, apresentados rostos de renome, que declaram o seu estado serológico.
Artistas da arena musical que, lado a lado com alguns anónimos, desmistificam a questão do HIV/Sida, tornam o assunto comum, do dia-a-dia…
Através dos seus exemplos pessoais inspiram as pessoas a conhecerem o seu estado serológico e seguirem o tratamento quando diagnosticados como positivos.
Clarisse Machanguana aproveitou o ensejo para alertar que “essas declarações públicas demonstram que esta doença não escolhe o bolso, o tipo… e não é problema das prostitutas. É de todos: dos políticos, dos artistas, dos atletas, dos anónimos…”.
NÃO PRETENDO SER TREINADORA
NEM DIRIGENTE
Afastada dos campos há três anos, a antiga internacional do básquete moçambicano já vinha reflectindo sobre o que faria após encerrar a sua carreira. “Queria um trabalho que me estimulasse intelectualmente”. Nesse entremeio veio a fundação.
Através dela empenha-se em causas humanitárias, trabalhando com crianças a partir dos dez anos, encaminhando-as através da educação, saúde e do desporto.
Mas o interesse por estas causas nasceu do acaso. A única certeza que tinha é de que “não queria ser treinadora de basquetebol”.
O argumento encaixa-se no facto de que “praticamente estaria a continuar o que vinha fazendo como jogadora, todos os dias…, de noite… Não estou mais para isso! O desporto foi uma porta para estar onde cheguei”.
Assim sendo, “a forma que encontrei para ser útil à sociedade é envolvendo-me em causas humanitárias, pois ser treinadora ou dirigente não me atrai”, afiançou.
Carol Banze
carolbanze@snoticias.co.mz
Fotos de Carlos Uqueio