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Importadores buscam soluções internas

Por admin

O Banco de Moçambique (BM) apelou recentemente para que os moçambicanos comecem a repensar nos bens de consumo que adquirem, uma vez que o país e o mundo atravessam período de turbulência cambial. Com efeito, o mercado começa a registar um crescente movimento de operadores que procuram soluções internas.

O Banco Central prevê que com a implementação e cumprimento das medidas de austeridade anunciadas recentemente pelo governo, o país comece a apresentar tendências de melhoria dos indicadores macroeconómicos a partir do final do primeiro trimestre do próximo ano, 2017.

Entretanto, aponta que para o alcance deste objectivo é necessário que se comece a apostar seriamente na produção interna a ponto de ser possível abastecer o mercado nacional e, assim que possível, se dê início à exportação dos excedentes para que se reequilibre a balança das importações e exportações.

Enquanto se espera pela reversão deste quadro através do incremento da produção nacional, o governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove, seguido pelo ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, mantém firme a convicção de que se deve adoptar uma nova postura na hora de adquirir bens de consumo.

É que, até há poucos meses, o défice no Orçamento do Estado, estimado em 35 por cento, era coberto pela entrada de capitais concedidos por doadores e em cerca de um bilião de dólares pelo Investimento Directo Estrangeiro (IDE).

Mesmo assim, as importações rondam os seis biliões de dólares, excluindo os grandes projectos, dos quais um bilião e 100 milhões de dólares são referentes à importação de combustíveis, 500 milhões de dólares vão para a importação de viaturas e 231 milhões de dólares para mandar vir cereais diversos.

Adriano Maleiane disse há dias aos representantes do sector privado que é preciso que comecem a pensar em “organizar o mercado para que seja possível resolver os problemas macroeconómicos que o país atravessa”. Para o efeito, apontou que se deve apostar em tudo o que possa gerar emprego, produtividade e competitividade.

Segundo o ministro Maleiane, “de nada nos serve ter um mercado que funciona à base de importações. Penso que o correcto seria termos um cenário em que 100 por cento da carteira de crédito nacional fosse concedida à produção nacional”, frisou. 

Porque o quadro começa a mostrar-se nebuloso, vários operadores do ramo de importações de bens alimentares começam a reorientar os seus planos de aquisições para o mercado nacional e a reduzir as quantidades, porque as divisas usadas nas importações, nomeadamente o dólar, rand e euro se tornam cada vez mais escassos e, por isso, mais caros.

A nossa Reportagem percorreu alguns estabelecimentos com peso na importação de bens alimentares e constatou que os mesmos já não oferecem o mesmo leque de opções de produtos de que dispunham há cerca de seis meses.

Por exemplo, no supermercado TerraMar, bastante conhecido pela venda de mariscos, os gestores revelaram que reduziram as quantidades por falta de divisas. Conforme disseram, até ao final do ano passado, aquele estabelecimento importava mensalmente entre 70 a 80 contentores de produtos congelados com particular ênfase para pescado e carnes. Entretanto, estas cifras baixaram para 10 a 15 contentores por mês.

Tivemos que parar de importar frango inteiro por razões burocráticas ligadas ao licenciamento dessa componente. Mas, para além disso, estamos com graves problemas para importar porque as divisas andam muito escassas no mercado e, por isso, fomos obrigados a rever as nossas quantidades e prioridades”, disse Francisco Santos, gerente daquela firma.

Segundo nos revelou, as limitações nas importações iniciaram em meados de 2015 e, a partir de então, as quantidades são progressivamente reduzidas devido à pressão cambial que tende a agravar.Estamos limitados, pior tendo em conta que não podemos ir buscar divisas no mercado paralelo por somos um projecto formal e precisamos manter todas as nossas transacções devidamente registadas e organizadas”.

IMPORTAR CÁ DENTRO

Mandip Patel, que representa o supermercado Jumbo, na cidade de Chimoio, província de Manica, disse que aquela empresa já não está a importar produtos, mas, sim, a adquiri-los nas cidades de Maputo, Beira, em Sofala, e Pemba, em Cabo Delgado.

Entretanto, a adopção desta medida tem sido prejudicada pela oscilação do dólar americano e do rand, pois os bens adquiridos nestas cidades são importados, cujos preços são influenciados pelo fortalecimento das divisas, o que influencia no preço ao consumidor.

Mandip patel explicou que, mesmo sem recorrer directamente ao mercado externo, até ao começo deste ano abastecia o estabelecimento com uma linha de 8 a 15 camiões carregados de mercadoria diversa. No entanto, presentemente está limitado à aquisição de produtos que perfazem a apenas dois camiões por semana.

Entre os bens que se viu forçado a suprimir constam produtos de higiene que, segundo referiu, o preço final não compensava. “Deixamos de vender alguns produtos porque parte das nossas contas está em crédito estabelecido em dólares e que é amortizado ao câmbio do dia. Isso prejudica-nos imenso porque pagamos acima do combinado daquilo que tínhamos planificado”, referiu.

PRODUÇÃO NACIONAL

No caso do grupo de supermercados conhecidos por “Extra”, que tem estabelecimentos um pouco por todas as principais capitais provinciais e que comercializa produtos de primeira necessidade, perecíveis, frutas e hortícolas, uma das evidências da crise cambial se traduz na constante flutuação de preços, substituição de importados por nacionais e desistência na venda de alguns produtos tidos como não essenciais.

Entretanto, a opção por produtos nacionais tem sido prejudicada pelo facto de não ser suficiente para cobrir o mês. “Continuamos a importar mas com dificuldades. Os bancos nunca têm moeda estrangeira e, por isso, reduzimos drasticamente os produtos. Tentamos colocar a produção nacional, mas só dá para vender, no máximo, durante duas semanas”, revelou-nos uma fonte do Extra.

Mesmo assim, a maior parte dos produtos perecíveis, nomeadamente yogurtes, manteiga, sumos, vegetais e frutas têm sido nacionais e, segundo a fonte, o que se pretende é maximizar o abastecimento com produtos locais, mas a realidade tem mostrado que esta não é suficiente.

Antes da crise este grupo importava dois a três camiões de produtos diversos, por semana, entretanto, nos últimos meses entram, no máximo, dois camiões por mês.

A fonte referiu que apesar de estar a apostar na produção nacional está cada vez mais difícil preencher as lojas. “Para além do problema da falta de divisas, que está a afectar o nosso país, a vizinha África do Sul também sofreu com o fenómeno “El Ninõ” que se caracterizou por uma seca severa e inviabilizou a produção”. Segundo a nossa fonte, o número de clientes que frequentam aqueles supermercados também reduziu significativamente.

Por seu turno, a AEL Interprise, que também possui uma rede de supermercados em várias cidades do país, também experimenta momentos de alguma amargura, uma vez que até há poucos meses importava quatro camiões contendo cerca de 330 toneladas de peixe carapau por mês. Porém, nos últimos meses diminuiu o número de camiões para apenas dois por mês.

Um dos mercados que mais consome o carapau importado pela A&L Enterprise é a cidade de Nampula, espaço onde o carapau tamanho 18 está a ser vendido a 740 meticais com tendência a subir, quando até há poucos meses era comercializado a 550 meticais.

Para além disso, a empresa também importava carne de vaca e, mensalmente, entravam dois camiões de 12 a 14 toneladas, mas por causa da depreciação do metical em relação ao dólar americano, rand, euro, entre outras moedas fortes, os gestores desta empresa resolveram apostar no fornecimento local. “Actualmente estão a comprar carne de vaca da província de Manica”, disse fonte da A&L Enterprise.

Um dos constrangimentos que a nossa fonte apresentou se relaciona com o facto de a produção nacional não satisfazer às necessidades do mercado local. “A produção nacional não consegue satisfazer a demanda. Por exemplo, adquirimos batata Reno nacional num fornecedor de Boane, província de Maputo, mas só deu para vender durante um único mês. Mesmo assim, estamos a procura de alternativas internas para evitar importar”, sublinhou a nossa fonte.

Enquanto isso, o presidente da Associação dos Micro Importadores, Fernando Matusse, referiu que a situação podia estar pior, mas não está porque ainda existe alguma produção nacional com a qual é possível abastecer o mercado.

Todavia, disse que as previsões para depois do mês de Outubro não são muito boas, pois a produção nacional só existe entre os meses de Abril até Outubro e, depois disso, os mercados são abastecidos exclusivamente por produtos importados.

A situação ainda é razoável. Mesmo assim temos que importar algumas quantidades para cobrirmos o défice. Até ao momento conseguimos encontrar a moeda sul-africana, mas a situação cambial tem sido proibitiva. Por exemplo, na semana passada o rand estava cotado a 4.900 por metical”, sublinhou

Por causa do actual custo da moeda sul-africana, alguns importadores começam a desistir de importar porque não estão a ver resultados e, para ultrapassar estes problemas, Matusse defende que a melhor alternativa seria convencer os empreendedores nacionais a investirem seriamente para que haja produtos nacionais durante todo o ano, ao contrário do acontece actualmente. “Temos condições internas para isso”, concluiu.

Texto de Angelina Mahumane
angelina.mahumane@snoticicas.co.mz

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