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Filhos da Independência

Por admin

Por ocasião do 25 de Junho, Dia Independência Nacional, ontem comemorado, o Jornal domingo procurou pelo país fora alguns moçambicanos com a idade dessa efeméride, para ouvir delas como souberam deste acontecimento, como cresceram e qual é sua contribuição para o desenvolvimento do país. Não foi fácil encontrá-los, porque nas suas caras não estão estampadas as datas de nascimento.

Hoje, apercebemo-nos que estes “filhos da Independência” estão connosco no dia-dia, alguns bem perto de nós. Ai vão os depoimentos que recolhemos em Maputo-província, Manica, Tete e Nampula, por ocasião dos 41 anos da nossa libertação.

É gratificante ter a idade da Independência

– Calisto Cossa, presidente do Concelho Municipal da Matola

Calisto Cossa é presidente do Concelho Municipal da Matola. Nasceu a 25 de Junho de 1975. Completou, como a Independência, 41 anos de idade. Diz que fazer anos nesta data é gratificante mas ao mesmo tempo constitui uma responsabilidade acrescida, tendo em conta a satisfação das necessidades dos munícipes que lhe confiaram a liderança daquela edilidade nas eleições autárquicas de 2013.

“Ter idade da independência e dirigir uma autarquia é gratificante. É um convite para redobrar os esforços no sentido de responder às expectativas das pessoas que depositaram o seu voto na minha candidatura e do partido que a suportou, neste caso, a Frelimo”,disse Calisto Cossa para quem é preciso trabalhar para libertar o país da pobreza. 

Para ele, celebrar 41 anos da independência nacional para além de ser gratificante é motivo de orgulho e de reflexão sobre os caminhos a percorrer no sentido de responder, “não só às exigências da sua autarquia, mas também dos outros municípios comprometidos com o desenvolvimento integrado de Moçambique”.

Calisto Cossa afirma que dirigir uma autarquia na sua idade significa ainda reconhecimento de que os jovens têm um papel preponderante no processo da construção de um Moçambique próspero, “ao mesmo tempo que damos vénia aos jovens do 25 de Setembro que libertaram Moçambique do jugo colonial português”.

Calisto Moisés Cossa nasceu justamente no dia 25 de Junho de 1975, no Posto Administrativo de Macuácua, distrito de Manjacaze, em Gaza, filho de Moisés Cossa e Laura Francisco, uma família humilde de camponeses.

Porque nasceu no campo, Calisto Cossa teve uma infância típica destas zonas, pois, em tenra idade foi pastor de gado. A sua vinda a Maputo aconteceu entre anos 1979/1980 na companhia dos seus progenitores.

Chegados à capital do país, Calisto Cossa frequentou o ensino primário e depois passou pela Escola Secundária Noroeste I, onde fez o ensino básico, para depois seguir o ensino secundário-geral, antes de ingressar no superior, onde obteve duas licenciaturas, a de ensino de história e geografia e de Direito pela Universidade Eduardo Mondlane.

Entre várias tarefas, desempenhou as de professor, antes de ingressar no Aparelho do Estado, concretamente no Ministério das Finanças, onde foi assessor do Ministro Manuel Chang, cargo que exerceu até ser confiado a missão de concorrer à presidência do município.

À cidade da Matola chegou por volta dos anos 92, um pouco depois da assinatura do Acordo Geral da Paz e segundo ele, os seus pais já tinham um terreno para a construção da sua habitação, mas dada à situação da guerra dos 16 anos levaram tempo para se decidirem pelo início da concretização daquele projecto familiar.

Sobre como é que se apercebeu que nasceu no Dia da Independência, a nossa fonte afirmou que foi através da sua avó materna que lhe dizia: “você nasceu no dia da independência, enquanto os moçambicanos celebravam efusivamente a libertação do jugo colonial português, a tua mãe trazia-te à luz do sol”.

A nossa fonte acrescentou que quando ingressou na escola foi ganhando mas cosciência disso, “porque ainda na 5ª classe, cantávamos canções revolucionárias e nas aulas de Educação Politica, já falávamos disso, sobretudo, da fundação da Frelimo, inicio e percurso da luta de libertação nacional”.

É marco histórico nascer no dia da Independência

– Virgílio Chicoroco, docente da Universidade Católica de Moçambique 

Está a trabalhar como professor, desde 2005 e iniciou a sua carreira em Vanduzi, na altura posto administrativo, actualmente distrito. Em Mavonde, está desde 2006. Marca-lhe o facto de ter nascido em pleno processo de libertação de países africanos. “Para mim, é um marco histórico, nascer quando Moçambique celebra a sua independência. Devido à guerra, muitos documentos pessoais ficaram perdidos. A nossa casa foi incendiada por homens da Renamo. Já que a minha mãe ainda se lembrava do dia do meu nascimento, ela foi quem me disse que nasci no dia 25 de Junho, dia da Independência Nacional”, explicou o docente.

Os pais contaram a Virgílio muita coisa sobre a história de Moçambique, desde o colonialismo até à luta de libertação. Uma delas é que tinha sido levado para tropa, mas, depois voltou por ser menor de idade, na altura. No seu lugar acabou indo ao serviço militar, o seu tio, irmão mais velho do seu pai.

“Sinto-me muito feliz, por ter nascido no dia da independência nacional. Nasci na data da independência e estou a crescer com o país”, confessa Virgílio Chicoroco, que assume um papel indispensável na luta contra o analfabetismo e diz entender que Moçambique deve continuar a crescer, sendo importante que se acarinhe a paz, pois, considera que situações de guerra só trazem retrocesso.

O professor é de opinião que a questão do conflito político-militar seja resolvida com maior brevidade possível, para que o país continue a trilhar pelos caminhos de desenvolvimento.“Devemos acreditar que o conflito político-militar vai passar. É uma fase. Os moçambicanos devem saber que tudo terá fim. O que temos que fazer é continuar a trabalhar para desenvolver Moçambique”, referiu Virgílio Chicoroco, para quem o desenvolvimento do país passa pela unidade entre os moçambicanos.

"Moçambique tem que continuar a crescer. Queremos mais escolas, estradas, unidades sanitárias, fontes de abastecimento de água. Para isso, temos que continuara a valorizar a independência e a paz que custaram o sangue de filhos desta pátria"apontou Virgílio Chicoroco que profetiza dias melhores para o país.

Já calcei folhas de árvores

-Belinho Eduardo, da província de Tete

Nasceu no dia 25 de Junho de 1975, em Mphanzu (Moatize). A sua mãe, Minaia Alcimoni assegurou o seu crescimento diante de muitas dificuldades durante a crise económica que abalou o país no pós-independência.

Acrescenta mesmo que já calçou folhas de árvore para evitar intenso calor, numa província com temperaturas geralmente altas. Diz ter feito o seu nível escolar (5ª Classe) sem sapatos.

Belinho não se esquece da guerra dos 16 anos, que afirma ter determinado o seu insucesso nos estudos. Os seus pais tinham que abandonar a comunidade de Mphanzu, distrito de Moatize, para Nhautreze, região  detentora de uma mina de calcário, a  escassos quilómetros  de Boroma, junto ao rio Zambeze. 

 Hoje a viver no bairro Sansão Muthemba, critica com algum sentimento de rtisteza a geração dos jovens de hoje que, segundo disse, vive de reclamações. “A sociedade actual não se entrega ao trabalho, não se submete ao sacrifício, não tem espírito de trabalho, daí a criminalidade”- afirma.

Conta ter ouvido falar do colonialismo português pela primeira vez na escola nas páginas dos livros de história, que o país foi produzindo, para ensinar os alunos o preço através do qual foi adquirida a independência.

Sou cinco meses mais velho

que a Independência 

– Dinis Viegas Manuel, médico em Nampula

Nasceu  a 1 de Janeiro de 1975, na cidade de Nampula,  posto administrativo de Natikiri, no bairro do Marrere, numa familia pobre e humilde. Foi criado num ambiente simples e muito ligado à religião.  Seus pais criaram-no trabalhando na Missao de São João Baptista de Marere.

Teve uma infância que considera “dificil”, mas muito ligada à Igreja Católica. Diz que esteve sempre atento aos estudos. Fez todo  o ensino primario na então Missão do Marrere, onde o seu pai trabalhava como carpinteiro e instrutor de carpintaria.

Frequentou o ensino secundário na Escola Secundária de Nampula e o  Pré-Universitario na então “1º de Maio” da mesma cidade. Entre 1996 e 2003, concluiu com o sucesso o curso de Licenciatura em Medicina na Faculdade de Medicina da UEM.

 De 2005 a 2015 trabalhou na provincia de Niassa,  inicialmente no Distrito de Cuamba como Médico e Director Distrital e depois foi colocado na capital provincial, Lichinga, já omo director provincial de Saúde, designadamente de 2010 a 2015. Actualmente está-se a especializar em Ginecologia Obstetricia no Hospital Central de Nampula.

“A decisão de escolher esta área, resulta da frustração com que me deparei ao longo da minha carreira como médico ao nivel do distrito, em particular, e da provincia, em geral. Lidei  com situações tristes de mulheres grávidas que morreram por complicações de partos e situações afins. Quero  dar o meu contriuto nesta grande batalha que o país deverá continuar a enfrentar e que ainda está ao nosso alcance”, confessa, Dinis Viegas.

Viegas acrescenta que “como filho da Independência”, sinto-me orgulhoso de ter nascido no mesmo ano em que o país alcançou a sua autodeterminaçao. A independência nos permitiu renascer como povo e nação”.

Ele cita o pai a dizer que a decisao que tomei  de frequentar um curso de Medicina era por si só simbolo da Independência, pois sendo ele de  pele escura“no tempo colonial, não era possível nem imaginável.  Não podias nem ser Juiz, nem Arquiteto… pois eram consideradas carreiras da elite. Eram carreiras abraçadas  pelos brancos e assimilados e não para os indígenas”.

O nosso entrevistado diz que as palavras do seu pai motivaram-no e desafiaram-no a enfrentar a adversidade. “Hoje, o país cresceu, formam-se médicos em Maputo, na Beira, em Nampula, em Tete e de certeza para o futuro, cada província poderá formar os seus próprios médicos, tudo fruto da Independência. Nós, às vezes, nos esquecemos de onde viemos e escamoteamos os factos! Os factos reais, nos dizem que hoje nós é que decidimos o que queremos”, concluiu.

Texto de Domingos Nhaúle, Domingos Boaventura, Assimo Camurada e Regina Manuel

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