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A maioria dos deputados da Assembleia da República (AR), membros das assembleias municipais e provinciais não visitam os respectivos círculos eleitorais, o que torna difícil a comunicação com o eleitorado. A constatação é de alguns cidadãos da cidade de Maputo ouvidos pelo domingo sobre como é que se comunicam com os mandatários do povo e fiscalizadores da acção governativa.
É comum e normal na
véspera de eleições,
sobretudo durante a
campanha eleitoral, ver
grupos de deputados
em contacto directo com os cidadãos
para “caça ao voto” que lhes
confere passaporte para o Parlamento,
assembleia municipal e
provincial.
No período eleitoral, os deputados
desdobram-se em incursões
aos bairros, residências,
locais de trabalho ou de aglomeração
de cidadãos para convencê-
los a votar nas suas listas
partidárias, prometendo em troca
fazer ecoar a voz da base nos
órgãos legislativos e na fiscalização
da acção governativa.
Esses contactos acontecem
geralmente acompanhadas de
um leque de promessas, sobretudo,
o melhoramento da vida
das populações, mas terminado o
processo, há “divórcio total” com
os eleitores.
Alguns cidadãos, contactados
pelo domingo nos círculos
eleitorais da cidade de Maputo e
Maputo-província, falam de mordomias
que os eleitos ganharam
enquanto quem os elegeu continua
com as ruas esburacadas.
Para os nossos entrevistados,
esta situação dá direito ao desespero,
visto que votaram numa determinada
lista com esperança de
ver a sua rua melhorada segundo
promessas eleitorais feitas, mas
nada está a acontecer.
Os poucos, que acompanham
as sessões parlamentares, da
assembleia municipal e ou provincial,
dizem não perceberem
como é que os deputados não se
deslocam aos bairros para trocar
impressões com o cidadão sobre
o dia-a-dia, bem como outros assuntos.
As jornadas parlamentares
segundo as nossas fontes,
circunscrevem-se a algumas instituições
públicas e ou privadas,
“mas em nenhum momento
organizam uma reunião num
bairro para falar da sua produção
legislativa”.
No seu entender, sendo a eleição
dos governantes considerada
único modo legítimo de delegação
do poder, estes deveriam prestar
contas aos eleitores dialogando
frequentemente com eles para a
concretização deste desiderato.
Seja como for, as eleições são
um elemento essencial do sistema
representativo, pois, são
um mecanismo constitucional
no qual o povo intervém no jogo
político por intermédio dos seus
eleitos.
Isso implica uma certa participação
dos cidadãos na gestão da
coisa pública, que se exerce sob
a forma de exercício da cidadania
e à medida da eleição. Para
os cidadãos contactados pelo
domingo os deputados são seus
representantes de tal forma que
lhes devem satisfação como seus
legítimos mandatários.
CIDADÃOS RECLAMAM
AUSÊNCIA DOS
DEPUTADOS
Gabriel Mufundisse residente
no bairro Zona Verde, Município
da Matola, diz que desde a entrada
do multipartidarismo em 1994
nunca viu pelo menos um deputado
a auscultar as preocupações
dos cidadãos do seu bairro.
Mufundisse, um dos ouvintes
que mais escuta a Rádio Moçambique
e assiste as várias televisões,
acrescentou que as poucas
vezes que interagiu com deputados
foi nas visitas das brigadas
centrais.
“Depois da campanha
eleitoral, não é fácil ver um
deputado ou membro da assembleia
municipal a visitar,
de sua iniciativa, um bairro e
reunir com a população para
ouvir as suas inquietações. O
contacto só acontece na campanha
e terminado essa fase
nicles, porque nem na célula
vimos um dos eleitos a auscultar
as nossas preocupações”,
disse. Aquele analista popular
acrescentou ainda que a situação
é preocupante para aqueles
distritos que nem se quer conseguiram
eleger um representante.
“Estava afecto à brigada do
meu partido (Frelimo) que trabalhou
em Magude na campanha
e de lá para cá ninguém se
fez ao distrito pelo menos para
falar com as pessoas e explicar
os planos para esta região”.
Sublinhou que ele só consegue
interagir com alguns deputados
nas sessões de Comité Provincial
onde é convidado permanente“Eu próprio consigo falar,
porque como convidado às
sessões do comité provincial
consigo apresentar os meus
pontos de vista, mas isso não
é suficiente. O ideal seria o
deputado ir fazer reunião
no bairro para falar das leis
aprovadas no Parlamento”,
disse o nosso entrevistado.
Por sua vez, Mário Dikson
é de opinião de que a relação
entre o deputado e o círculo
eleitoral devia ser mais profícua
e intensa, para haver troca
de impressões sobre o pulsardo país.
Segundo afirmou, o deputado
devia concentrar as suas acções
durante as jornadas parlamentares
em encontros com as
populações para ouvir as opiniões
sobre o seu desempenho e
alistar as preocupações.
“Eu morro no bairro do
Alto Maé e nunca fui abordado
por algum deputado para falar
de qualquer que seja assunto
tratado quer no Parlamento
assim como na Assembleia
Municipal. A única vez que
falei com eles foi durante o
décimo Congresso da Frelimo
em Pemba”, disse.
No seu entender, se houvesse
listas uninominais provavelmente
o deputado iria contactar o
eleitorado, mas como são eleitos
por uma lista partidária terminado
o processo tomam assento e
se esquecem dos eleitores.
“Nunca ouvi que um deputado
esteve no círculo, administração
ou reuniu-se com a
sociedade civil para auscultar
as suas preocupações. Não sei
qual é o mecanismo que eles
usam para contactar as pessoas
que lhes elegeram”, disse
Dikson.
Alexandre Boquisso, reside
no bairro de Ndavela, afirmou
que a única vez que viu um deputado
e tentou falar com ele foi
numa cerimónia fúnebre, mas
que dado o ambiente de tristeza
não foi possível.
Disse que várias são as pessoas
que pretendiam saber do
tal representante do povo na AR
sobre o porquê por exemplo as
três bancadas viabilizaram a lei
de Previdência Social do Deputado,
quando divergiram na aprovação
do Orçamento do Estado
e o respectivo Plano Económico
Social.
“Foi uma pena porque estávamos
no velório, mas aquela
foi a única oportunidade que
estivemos perto de um deputado,
pois, só vemos na televisão
quando há sessão ou em
visita a instituição pública,
como foi, por exemplo, com
os deputados da Comissão da
Defesa e Ordem Pública que
visitaram o Ministério da Defesa”,
referiu Boquisso.
Deputados reagem:“Seguimos orientação partidária”
O deputado Damião José, eleito
pela Frelimo no círculo eleitoral da
Zambézia, diz que comunica com o
eleitorado de duas formas, nomeadamente,
a formal (em que através
de orientação do partido e em grupos
visita os distritos) e a informal
(onde com um simples telefonema
consegue obter informações sobre
as inquietações dos eleitores).
Explicou ainda que esse trabalho
é feito durante as sessões parlamentares
ou nos intervalos. Sublinhou,
a título de exemplo, que, umas das
preocupações da população da Zambézia
está relacionada com as vias
de acesso, destacando entre outras,
a asfaltagem das estradas Mocuba-
-Milange e Nampevo-Ile-Gurue- Milange,
bem como a reposição das
pontes ligando os distritos de Namacurra
e Maganja da Costa.
“A interacção é feita dentro
da linha da orientação do partido.
Portanto, a partir da província,
integramos o grupo dos
eleitos nesse círculo eleitoral,
onde cada um de nós é vinculado
para fazer a fiscalização da
acção governativa, auscultação
das inquietações, mas sobretudo
interagir com a população sobre
a implementação do programa de
governação”, disse Damião José,
ressalvando que depois disso os assuntos
são levados ao Parlamento
durante às sessões de perguntas ao
Governo.
COMUNICAR ATRAVÉS DAS
REDES SOCIAIS
Outros deputados ouvidos pelo
nosso jornal explicaram que se comunicam
também com o eleitorado por
via das redes sociais, nomeadamente,
youtube, skype e facebook, onde trocam
mensagens sobre o pulsar político.
Francisco Campira, deputado da
Renamo pelo círculo eleitoral de Sofala,
explicou que mesmo antes de sua
eleição já mantinha vínculo com uma
certa franja de admiradores através
das redes sociais.
“Também fiz campanha no facebook,
pelo que mesmo depois
da eleição continuo a falar com
eleitores por este meio. Em breve,
vou aos distritos de Muanza e Marromeu
para reunir com a população
e falar dos programas para o desenvolvimento”,
disse Campira.
No seu entender, as redes sociais
são o meio mais rápido para a interacção
com o eleitorado, porque permitem
um contacto directo durante o
debate de uma determinada matéria,
onde as pessoas apresentam os seus
pontos de vista.
Entretanto, Campira ressalvou
que não tem tido tempo suficiente
para deslocar-se ao seu círculo eleitoral
em virtude de estar ocupado com
trabalhos da Comissão de Petições,
Queixas e Reclamações de que é vice-
-presidente.
O que é círculo eleitoral?
Círculo eleitoral ou distrito eleitoral
é uma circunscrição territorial criada
para fins eleitorais, a cujos eleitores
inscritos corresponde determinado
número de mandatos, previamente
definido, no órgão a eleger.
A dimensão do círculo pode ir da
simples freguesia, município ou unidade
semelhante, como ocorre nas eleições
autárquicas, até à totalidade do
território nacional, como acontece nas
eleições presidenciais e legislativas.
Quando os círculos são plurinominais,
é em geral utilizado um método de
distribuição proporcional dos mandatos
para garantir que o número de eleitos
de cada lista reflicta adequadamente a
proporção dos votos recebidos.
Estes métodos contêm por vezes
provisões de discriminação positiva em
relação às minorias, facilitando a atribuição
de pelo menos um mandato, embora
também seja comum a existência
de um valor limiar, normalmente fixado
em percentagem do voto válido, que
exclui as listas que o não atinjam. Uma
dessas formas mais comuns, de distribuição
proporcional dos mandatos, é
o método de Hondt.
De referir que o nosso território eleitoral
divide-se em 11 círculos, correspondendo,
cada um, a uma província,
incluindo a cidade de Maputo, elegendo
um determinado número de deputados.
A província de Nampula é o maior
círculo eleitoral, seguindo-se as províncias
de Sofala, Tete, Cabo Delgado.
O número de deputados a eleger
por cada círculo depende do número
de cidadãos recenseados nesse mesmo
círculo eleitoral, com excepção
dos círculos correspondentes aos
eleitores residentes fora do território
nacional.
Domingos Nhaúle
Nhaule2009@gmail.com