O Conselho Constitucional (CC) procedeu, na última quinta-feira, em Maputo, à validação e promulgação dos resultados das Eleições Autárquicas de 20 de Novembro último. Ainda assim, aquele órgão jurídico-constitucional decidiu anular a eleição do presidente do Conselho Municipal e dos membros da Assembleia Municipal de Guruè, província da Zambézia, por considerar que houve irregularidades que põem em causa a validade dos resultados apurados.
Para a validação destas eleições, o CC considerou que estão totalmente preenchidos os pressupostos constitucionais e legais do processo de validação, e aponta irregularidades que não influenciaram os resultados finais.
Os resultados anunciados através do Acórdão Número 4/CC/2014 de 22 de Janeiro dão vitória à Frelimo em 49 autarquias e ao Movimento Democrático de Moçambique (MDM) em três municípios dos 53 em que se realizaram eleições.
Discursando na ocasião, o presidente do CC, Hermenegildo Gamito, referiu-se à anulação da eleição no município do Guruè “em resposta ao preceituado no número um do artigo 173 da Lei 7/2013, de 22 de Fevereiro, sobre ilícitos eleitorais”.
Por se tratar de um caso especial, os órgãos eleitorais vão reunir nos próximos dias para apurar o que é que prevê a legislação para este tipo de casos e só depois é que irão tomar as medidas que culminarão com a nova eleição. A mesma irá compreender todas as fases desde o novo recenseamento, campanha eleitoral e finalmente a votação.
No acórdão assinado pelos sete juízes que compõem o órgão, o CC refere que o MDM, através do seu mandatário nacional, interpôs recurso perante aquele órgão jurídico-constitucional, pedindo a impugnação da deliberação número 70 da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de 4 de Dezembro de 2013, que aprovou a acta da centralização nacional e apuramento geral dos resultados das eleições de 20 de Novembro passado.
“O Conselho Constitucional apreciou o recurso, através do Acórdão N.º 03/CC/2014, tendo decidido negar provimento ao recurso porque, ao invés de se fundamentar com base em factos que tivessem ocorrido no decurso do apuramento dos resultados eleitorais, o objecto da deliberação da CNE então recorrida impugna resultados do apuramento autárquico intermédio da eleição do presidente do Conselho Municipal de Guruè, apuramento do qual já havia recorrido ou reclamado para a CNE e esta decidira pela sua improcedência”,lê-se no documento que temos vindo a citar.
No mesmo documento, o CC refere que, ainda assim, foi examinado o material probatório junto aos autos, que consistia, principalmente, em fotocópias de originais, duplicados e triplicados de actas ou editais relativos ao apuramento parcial dos resultados da eleição do presidente do município de Guruè, realizada nas 49 mesas de voto que funcionaram na área desta autarquia.
“Perante várias irregularidades detectadas naqueles documentos, o CC requisitou à CNE actas e editais originais das 49 mesas de voto da autarquia. Analisado o material da CNE, constata-se que enferma de várias irregularidades”,refere o documento lido por Hermenegildo Gamito perante uma plateia constituída por membros da CNE, quadros do Secretariado Técnico da Administração Eleitoral (STAE) e dos partidos concorrentes a estas eleições com destaque para a Frelimo e o MDM.
Dentre as irregularidades encontradas, destaque vai para a falta de assinatura do presidente da mesa no termo da abertura das actas de algumas mesas; editais com número de votos ou de votantes rasurado, mas sem qualquer ressalva, outros com a alteração do número total de votos em branco introduzida, alegadamente, sob a autorização da comissão eleitoral da Zambézia, mas sem apresentação de qualquer deliberação nesse sentido.
Contam-se ainda como irregularidades editais com assinatura do presidente da mesa de voto, mas sem carimbo; editais com número de votos ou de votantes rasurado; actas e editais com troca de posições dos candidatos, figurando o MDM na primeira linha e Frelimo na segunda, enquanto o correcto seria o contrário; entre outras ilegalidades.
Para o CC, além de configurar uma flagrante violação da Lei por parte dos membros das mesas de voto, assim como da Comissão Provincial de Eleições da Zambézia, esta situação suscita dúvidas quanto à fiabilidade dos dados numéricos reflectidos nas actas e nos editais do apuramento parcial dos resultados eleitorais.
Com vista a dissipar estas dúvidas, o CC requisitou, entre outros materiais, boletins de voto pertencentes a algumas mesas, mas tal pedido não foi respondido positivamente uma vez que o referido material não foi achado na Comissão Distrital de Guruè, presumindo-se que tenha sido extraviado durante os tumultos ocorridos nas mesas de voto quando se procedia ao apuramento parcial da votação.
Perante esta situação, o CC considerou necessário requisitar à CNE os originais das actas e editais de apuramento parcial em Guruè para efeitos de exame. Recebido este material, constatou-se que também enferma em número considerável de irregularidades similares aos das actas e editais relativos ao apuramento parcial.
“Da apreciação que fizemos resulta que, pela sua natureza e gravidade, tais irregularidades prejudicam seriamente a credibilidade dos editais e actas em causa e, acima de tudo, permitem a este Conselho Constitucional formar a convicção de que influenciaram globalmente e de forma decisiva os resultados eleitorais relativos à eleição a cada órgão”,sublinhou o Presidente do CC, Hermenegildo Gamito.
Refira-se que os resultados do apuramento geral divulgados pela Comissão Nacional de Eleições no município de Guruè davam vitória à Frelimo, com 50,11 por cento dos votos válidos, contra 49,88 por cento do MDM, para a Assembleia Municipal.
No que se refere à eleição “presidencial”, o concorrente da Frelimo, Jahanquir Jussub, arrecadara 50,49 por cento dos votos válidos e o do MDM, Orlando Janeiro, 50,20 pontos percentuais.
No que se refere às restantes autarquias, o CC validou e promulgou os resultados do apuramento geral da eleição que dão vitória à Frelimo e os seus candidatos em 49 autarquias e ao MDM e os seus concorrentes em três municípios.
Entretanto, os representantes da Frelimo e do MDM analisaram de forma díspare o acórdão do CC. Enquanto o do partido no poder considera que os juízes agiram em plena consciência e factos apurados no terreno; o do MDM entende que aquele órgão perdeu uma oportunidade para vincar a verdade validando a vitória do seu candidato.
A Frelimo, através de Edson Macuácua que falava na qualidade de mandatário para esta cerimónia, afirmou que respeitava a decisão e que os quadros do partido irão analisar a questão em sede própria e em momento oportuno iriam se pronunciar.
José de Sousa, mandatário nacional do MDM, disse que a sua organização não está satisfeita com a decisão do CC de anular a eleição no município de Guruè, na Zambézia.
“Não estamos satisfeitos porque ficou aqui bem patente que nós estamos num país de mentiras porque, na verdade, em relação a Guruè o MDM e o seu candidato venceram as eleições”,afirmou.