“Todos os irmãos…saudai-vos uns aos outros com ósculo santo” 1Co16:20
Como forma de as pessoas que amiúdes se relacionam comigo compreenderem a razão da minha indisfarçada relutância ou timidez, face à saudação através do beijo, vezes sem conta faço questão de trazer ao de cima as minhas origens. O facto é que, apesar de ter nascido no seio de uma família praticante dalguns valores ocidentais, exemplo da religião Cristã, não obstante, grande parte da minha infância foi influenciada pelas “asas” dos meus avôs paternos, meus aios, que eram marcadamente irreligiosos, ou seja, apesar de teremacerteza da existência de vários “deuses” e de inumeráveis coisas abstractas, ainda assim, não praticavam nenhuma religião, no sentido restrito do termo. Acreditavam, isso sim, na desencarnação do Homem, mas não na sua morte. Por isso na nossa língua, (minha e dos meus avôs), – Txi Txopi – a palavra “Morte”, só se aplicava aos Líderes, “Va Koma”, únicos que morriam e eram atirados numa lagoaça com areias movediças que os engoliam. Daqui o lugar chamar-se “Txi Tshotsha Va Koma”, que significa, lugar onde se “perdem” os Líderes. Os “Peões”, malta “Kandiyane & Compª. Ldª.”, quando “desencarnassem”, só deixavam de existir fisicamente e ficavam feios, (Va Bihid`e), desapareciam, (Va mwalad´e), deixavam-nos, (Va hi Sid`e). Quanto ao lugar onde os reles eram enterrados, o seu conhecimento era proibido para menores e só os mais velhos sabiam da sua localização. Sobre o beijo, não tive professor, porque na cultura da minha tribo publicamente não era praticado. Mesmo nos ritos de iniciação, (Circuncisão por exemplo), onde se ensinavam alguns princípios e algumas maneiras, nada dele falavam. Só ouvi pela primeira vez da sua prática na Bíblia:“Na escuridão da noite, ele subiu ao monte até chegar ao jardim onde Jesus havia ido orar. Guiando uma multidão armada, Judas se aproximou do Senhor e o beijou” (Lucas 22:47-48).E, a História Universal ensina-nos que, para a antiguidade grega e romana, o beijo era comum entre guerreiros no retorno dos combates. Era uma espécie de prova de reconhecimento. Apesar de os gregos adorarem beijar, foram no entanto os romanos que difundiram a prática. Os imperadores permitiam que os nobres mais influentes beijassem os seus lábios, e os menos importantes as mãos. Os súbditos podiam beijar apenas os pés. Eles tinham três tipos de beijos: o “basium”, entre conhecidos; o “osculum”, entre amigos; e o “suavium”, ou beijo dos amantes.Na língua dos esquimós, a palavra “beijar” é sinónima de “cheirar”. Por isso que, na hora de dar um “beijo de esquimós”, esfregam-se os narizes. No mundo Bíblico, o beijo era uma saudação comum. O “Ósculo Santo” é uma saudação realizada com um beijo. Para os primeiros cristãos, todavia, tornou-se um sinal do amor fraterno. É por isso que se acrescentou o adjectivo ”Santo”. Pedro chama de “beijo da caridade” (1Pedro 5,14). Tertuliano, um dos padres da Igreja, o definia “osculum pacis” e as Constituições Apostólicas o chamavam de “beijo do Senhor”. Justino, outro Padre da Igreja e mártir, diz que era normal entre os cristãos dar-se um beijo fraterno antes da Santa Ceia. Desta prática deriva o "abraço da paz" que os católicos realizam antes da comunhão, no rito da missa. Agora pergunto eu: entre nós, porquê apenas beijamos as bochechas das mulheres e nós homens só nos abraçamos? Porquê em certas “igrejas”, os homens sentam-se separados das mulheres, num Pais onde todos somos iguais perante a Lei. Não será esta prática segregacionista! Para mim, depositar flores nas Campas, (grande desperdício!) e beijar as faces duma mulher que não seja as da filha da minha sogra, são práticas incómodas. Aliás, no caso do beijo, julgo ser anti-higiénico, pois alguns portadores de doenças e fumadores, limpam os seus lábios sujos nas bochechas duma desgraçada mulher. Eis a questão!
Kandiyane Wa Matuva Kandiya
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