O Governo da FRELIMO deu por encerrada, no dia 09 de Agosto de 2013, a discussão do ponto sobre a paridade eleitoral em sede das negociações. Embora a maioria dos pontos em negociação tenham
tido consenso, a RENAMO jurou de pés juntos que sem consenso naquele ponto, nenhuma matéria adicional seria chamada ao diálogo. O resultado disso é que o impasse nas negociações continua a deixar os moçambicanos apreensivos quanto à tranquilidade nas eleições que se avizinham, assim como, àmanutenção e consolidação da paz no país.
Chegados a essa fase, e cumprindo a minha promessa de trazer para este espaço uma reflexão em torno desta questão, é momento de juntar a minha voz a de tantos outros perguntando: 1. Afinal, perdemos o quê com a paridade? 2. Por que a paridade causa incómodo? 3. Que espécie de força a RENAMO vê na CNE que prefere hipotecar vários pontos da Agenda já consensualizados? 4. Que espécies de poder o Governo tem medo de perder que o fazem ser contrário a ela?
Estas perguntas que são de pensamentos diferenciados na sociedade mostram, à partida, que existem desconfianças quer do lado dos que defendem a paridade, quer do lado distante dela. Assim, procurando responder à primeira questão, percorri pela Lei – Mãe, onde não encontrei evidências concretas de que ela traga prejuízos para a Constituição da República de Moçambique (CRM) se vigorar, tanto mais quetodas as funções às quais o parlamento deve eleger cidadãos para diferentes órgãos estão bem patentes na CRM.
Com relação a segunda questão (porque a paridade incomoda?), cuja resposta também serve para o questionamentos 3, parti do princípio de que um órgão fiscalizador envolvendo várias sensibilidades, como é a CNE, é fortalecido pelo seu equilíbrio. Nesta perspectiva, a sua composição deve ser equilibrada de forma há não ter tendência de favorecimento de uns em detrimento de outros. Aliás, olhando para a objectividade, e pegando na transpolação futebolística com que a RENAMO tem vindo a bombardear a sociedade, dois actores na mesma contenda não podem iniciar um novo jogo com número desigual de jogadores só porque um saiu vencedor na peleja passada.
Diante disso, para o segmento de desconfiança que engloba a RENAMO, o argumento de que a FRELIMO representa a maioria e, por tal, tem que ter um corpo de pessoal maior num órgão fiscalizador em que a própria FRELIMO é participante se apresenta bastante frágil, já que levanta suspeições mais que suficientes de que com representações desproporcionadas, a formação que apresenta maior número obterá vantagens, uma vez que a CNE e o seu braço técnico (STAE) agiriam como guardiões da vitória da FRELIMO na secretária. Pelo que, deverá ser esse o poder que a RENAMO entende existir na CNE e que, a todo custo, pretende alcançar. Será que existe esse poder na CNE?! Será que a CNE é tão determinante na eleição de certo Partido e de um certo candidato?
No meu entender, a resposta a estas últimas questões respondem a pergunta 4 e trazem à baila as reticências da FRELIMO em ceder com a paridade. Pois, entrando no pensamento deste cinquentenário Partido, a paridade não deve existir porque: 1º – O n.o 5 do artigo 24 do Regimento da Assembleia da República define que nos órgãos em que a AR toma parte, ela deve estar de acordo com o princípio da representatividade. 2º -Quer queiramos quer não, muitas vezes, a composição equilibrada se revela de difícil resolução quando um determinado assunto vai a votos e se obtêm a situação de empate. 3º– A paridade não pode ser entre os partidos políticos de forma isolada mas sim entre o partido vencedor e o conjunto dos partidos da Oposição.
Com relação ao primeiro ponto (princípio da representatividade parlamentar), e tendo em conta que a lei é feita pelos homens, ela pode ser alterada. Aliás, de altos quadros da FRELIMO ouvimos alto e em bom-tom que, para o bem da Nação, essa questão pode ser ultrapassada. Para sustentar essa posição trouxeram para o exemploa não observância doprincípio da proporcionalidade na presente lei para acomodar (por princípio de inclusão) o MDM (se seguíssemos o princípio da proporcionalidade, somente a Frelimo e a Renamo indicariam os oito membros, 6 pela Frelimo, 2 pela Renamo e nenhum membro para o MDM).
Com relação ao segundo caso (divergência e votação), muitos académicos e políticos asseveram que este imbróglio pode ter solução com o voto de qualidade do Presidente. Aliás, numa altura em que a CNE é constituída por um número impar de membros o empate não é vislumbrado. Todavia, enganam-se os que julgam que uma questão de impasse só resulta de empate na votação. Pois, das consultas aos que estão por dentro do assunto, fiquei a saber que a representatividade parlamentar ganhou maior força a partir do momento em que membros da RENAMO nas assembleias de voto não aceitavam assinar as actas de apuramento e, por consequência, não se podia divulgar os resultados. Não será este o receio que a FRELIMO tem para o caso de a RENAMO querer transportar uma de suas imagens de marca (não assinar actas) e não subscrever documentos à submeter para a entidade que valida as eleições? Então, se tivermos a paridade e a RENAMO (e porque não a Oposição toda) continuar a fazer o que nos habituou (não assinar as actas) como é que o conflito se resolve? O Conselho Constitucional irá validar resultados subscritos por parte de membros da CNE?
Indo ao ponto três (paridade entre todos os partidos), e ainda imaginando o pensamento da FRELIMO, esta solução constitui impedimento porque ao exigirmos paridade entre um Partido com maioria e partidos secundários (da Oposição) não estaremos a escolher uma metodologia que fortifique a democracia, mas sim, a fazer uma pseudo promoção da igualdade de oportunidades para partidos trabalhadores, vencedores, mandatados pelo povo com partidos que só surgem em momentos eleitorais. E, com isso, a probabilidade de surgir uma Oposição (concertada) com maioria aumenta.
Então, se numa democracia representativa os que têm maioria é que representam os eleitores, como queremos que os partidos da Oposição de forma singular tenham o mesmo peso do que venceu? Se nós sabemos que cada partido da Oposição pode se aliar ao outro, passando a ser maioria… chamaremos a isso de paridade, democracia e vontade popular?!
Considerando esses argumentos e questionamentos, acredito que não se deve encarar a questão da paridade como um bicho-de-sete-cabeças. Essa a ser feita deve se reger por princípios democráticos e includentes. E, em nome desses princípios, o Partido que obtém a maioria não deve nunca estar em igualdade (paridade) com um outro partido, mas sim, poderá fazer a paridade com a Oposição toda, na medida em que quando se assume a vitória e se forma o Governo, o resto dos partidos passa à Oposição, sejam eles construtivas ou de mãos dadas.