Tomás António Pondja, 45 anos, e Abida Auar Vazirna, 33, nasceram surdo-mudos. Vivem juntos há dez anos, têm duas filhas, contudo só no passado dia 25 de Junho decidiram oficializar a relação perante o Estado.
Seu casamento chamou atenção de muita gente por se tratar de acontecimento insólito, raro, entre nós. Dezenas de pessoas acorreram a Zimpeto e também ao palácio para ver os nubentes.
Trajados a rigor, e acompanhados por familiares, padrinhos e amigos fizeram o cortejo habitual neste tipo de cerimónias e revelaram cumplicidade surpreendente.
Foi lindo vê-los de mãos dadas, trocando afagos da circunstância. A “conversa” seguia uma linguagem gestual bem precisa, tratando-se, ambos, cidadãos que estudaram na Escola Especial Número Um, na cidade de Maputo.
Aliás é na escola onde, no calor dos gestos, emergiu uma relação hoje radiante be que está nitidamente a dar frutos.
Sabido que nas festas de casamento, normalmente a curiosidade vai para o vestido de noiva, os circunstantes desta feita tinham outro propósito: verificar como os noivos haveriam de manifestar, expressamente, a sua vontade de se unir, um protocolo que deve ser seguido às riscas.
Veio a surpresa: foram convidados os intérpretes de linguagem de sinais que com gestos perguntaram a cada um dos nubentes se se casavam pela livre vontade. E a resposta foi “sim” com maneio simpático da cabeça obedecendo certo ritmo na comunicação.
Não houve ali qualquer artificialismo. A comunicação foi precisa, objectiva e voltada para um protocolo marcado por circunstancialismo insólito para muita gente que viveu aquele lindo casamento.
Tomás e Abida trocaram alianças, beijaram-se e deleitaram-se com o momento mais solene das suas vidas, mostrando à todo o mundo que são cidadãos normais, com sentimentos e sentido de compromisso com as regras sociais.
Seus filhos, de 5 e 9 anos de idade, não cabiam em si de contentes. Lado a lado com os progenitores, eram meninas orgulhosas.
Ambas falam. Não herdaram a deficiência dos pais.
CASAL EXEMPLAR
Como dissemos acima, o casal passou pela escola especial. Para além de recorrer a gestos, marido e mulher trocam mensagens por escrito, recorrendo, por vezes, ao telefone celular.Estão habilitados a ler livros.
Tomás trabalha como servente numa das bombas de combustível da capital e ganha-pão para a sua família, apostando, sobretudo na educação dos filhos.
Estevao Salomão Nguenha foi o padrinho deste casamento insólito. Para ele esta união foi uma obra de Deus. “É muito raro encontrar casamentos desta natureza”, disse.
Acrescentou que não é uma pessoa estranha àquela família. “Conheço-os deste que se conheceram na escola e sempre transmiti a minha força, carinho e solidariedade”, sublinha.
Ressalvou que a realização do casamento a 25 de Junho foi mesmo para enquadrar-se na força de uma grande data histórica no nosso país, mais uma vez ressaltando o insólito de um enlace entre dois cidadãos moçambicanos que não falam e nem ouvem.
“Foi uma grande festa. Esteve muita gente no casamento. Pensavamos que a comida não chegaria, mas a mão de Deus esteve aqui e multiplicou o pouco peixe que tínhamos”,conta-nos o padrinho meio a brincar.
Judite Conja, a mãe do noivo, disse que o casamento do filho faz dela uma mãe orgulhosa.
Disse que o casamento de Tomás e Abida não pode ser apenas ser valorizado pelo lado insólito. Salientou que o casal auto-superou-se e revelou à sociedade uma lição de paixão e amor, a mesma lição que no dia-a-dia esboça o caminho da amizade, fraternidade e da entreajuda.
“Eles se amam muito. Conversam muito. Trocam-se mensagens. Não tinham filhos. Fizeram filhos a viver juntos. Cultivando o amor”, conta-nos visivelmente emocionada.
Texto de Bento Venâncio
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