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Ouro “amargo”

Por admin

Mau estado de vias de acesso tornaLupilichi, um posto administrativo do distrito do Lago, num paraíso à parte, explorado por estrangeiros ilegais dedicados ao negócio de ouro no Niassa. População clama por melhores dias.

 

Pouco mais de 160 quilómetros separa Lupilichi da vila municipal de Metangula, sede do distrito do Lago, e 267 da capital provincial de Niassa, Lichinga. Por causa das suas potencialidades na produção de ouro, pessoas de diversas nacionalidades cruzam naquele pequeno e modesto posto administrativo, sendo a maioria proveniente de países dos Grandes Lagos.

domingo esteve lá a acompanhar a visita do governador de Niassa, Arlindo Chilundo, e cedo constatou que o movimento de pessoas e bens continua intenso, apesar do trabalho de “limpeza” feito recentemente pelas autoridades policiais com vista a libertar aquela zona de actos criminosos, próprios de locais onde o dinheiro fala mais alto.

Para além do estado avançado de degradação das vias de acesso, a acção devastadora dos garimpeiros é visível. Grandes crateras se destacam em tudo o que é canto e, em consequência, os rios, incluindo o opulente Rovuma, estão completamente poluídos e contaminados, deixando as várias espécies de peixe à sua sorte, com elevadas consequências para a saúde humana.

Em conversa com a nossa Reportagem cidadãos disseram que Lupilichi é, hoje, um conjunto de preocupações, começando pela falta de iluminação até à ausência do sinal de telefonia móvel, factos que agravam ainda mais o isolamento daquele local potencial na extracção do ouro.

Segundo alguns populares, a prospecção de ouro em Lupilichi, incluindo a descoberta, iniciou com cidadãos tanzanianos que, mais tarde, despertou a atenção dos nacionais com quem passaram a disputar a actividade, com larga vantagem para os primeiros, uma vez que, sendo eles detentores de grandes recursos financeiros, passaram a usar a mão-de-obra dos nacionais, bem como a compra do ouro por estes extraído.

Para defender os nacionais, Governo decidiu orientar os garimpeiros locais a exercer a actividade em associações, ao mesmo tempo que orientava a Polícia a desencadear uma acção tendente a reduzir o número de estrangeiros, na sua maioria em situação ilegal.

POPULAÇÃO CLAMA POR MELHORES DIAS

Os problemas de Lupilichi não se esgotam na difícil acessibilidade, comunicação e falta de energia. O transporte para sede do distrito é outro quebra-cabeças.

Com o efeito, quem quiser sair de Lupilichi para Metangula tem de fazê-lo com recurso a motorizadas, em troca de três mil e quinhentos meticais para um percurso de cerca de 160 quilómetros, preço que chega a subir quando a viagem é feita durante o período chuvoso.

Somos obrigados a gastar mais de sete mil meticais para uma viagem de ida e volta, de Lupilichi a Metangula, denunciou um ancião que não quis identificar-se, por temer represálias.

Disse não dispor de recursos suficientes para se deslocar à vila-sede do distrito do Lago, onde se encontra a residir parte da família.

Segundo aquele ancião, a maioria dos transportadores está com a ideia pré-concebida de que, tratando-se de uma zona onde se explora o ouro, Lupilichi é habitado por pessoas abastadas. Não é verdade. Grande parte da população de Lupilichi não tem um tostão no bolso sequer, protestou o nosso interlocutor, à margem do comício popular.

Explicou que poucos moçambicanos conseguem obter dinheiro suficiente para o seu sustento, apontando os estrangeiros como sendo aqueles que desfrutam de melhores condições de vida, resultantes da produção e compra de ouro, para além de outros negócios, nomeadamente a venda de capulanas tanzanianas e de outras quinquilharias provenientes daquele país vizinho.

Aliás, de acordo com relatos de pessoas que falaram durante o comício interactivo havido em Lupilichi, orientado pelo governador Arlindo Chilundo, a Tanzania tem se revelado muito útil na solução de grande parte dos problemas daquele posto administrativo, pois com dificuldades de chegar a Metangula ou Lichinga, grande parte dos produtos, incluindo de primeira necessidade, é adquirida naquele país vizinho.

Não sei o que seria de nós se não fosse a Tanzania, que facilita a nossa entrada para adquirir alimentos, defendeu um residente daquele posto administrativo, acrescentando: quando adoecemos, recorremos aos hospitais tanzanianos, nos quais recebemos a necessária assistência médica.

Chilundo ouviu todas as queixas e, no fim, reconheceu que elas eram legítimas. Apontou as difíceis condições de acessibilidade a Lupilichi, devido às dificuldades das vias de acesso, como estando na origem dos múltiplos problemas por que passam os residentes daquela área residencial.

As queixas demonstram que as populações estão atentas à governação do país, anotou Chilundo, ao mesmo tempo que prometia resolver o problema, mas de forma gradual, tendo em conta as disponibilidades materiais e financeiras que o Governo atravessa.

Refira-se que a via em referência está, neste momento, a beneficiar de trabalhos de reabilitação, tendo sido reparados pouco mais de 20 quilómetros. Espera-se que o remanescente esteja concluído no próximo ano, sem datas definidas.

O governador instou os garimpeiros a organizarem-se em grupos ou associações para melhor explorarem os recursos de forma sustentável, explicando que desta forma, a exploração do ouro vai beneficiar a todos os moçambicanos quando do exercício da actividade resultar no pagamento dos devidos impostos.

Texto de André Jonas
andre.jonas@snoticicas.co.mz

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