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Há bebedeira no Cemitério de Michafutene

Por admin

Os utentes do Cemitério de Michafutene, localizado no distrito de Marracuene, estão a ser confrontados com a venda e consumo de bebidas alcoólicas de toda a espécie na entrada daquele local que se pretendia que fosse reservado ao recolhimento, pesar e de respeito.

Os vendedores, que são residentes das cercanias, construíram cerca de uma dezena de barracas em material precário e, para além de vender bebidas, vão ao extremo de preparar petiscos, sopas e refeições variadas para a clientela que, geralmente, é composta por pessoas que para ali se dirigem com o intuito de participar em cerimónias fúnebres.

A nossa equipa de Reportagem dirigiu-se àquele local na manhã de ontem e, em uma das bancas, estava concentrado um grupo de homens de barba rija e mulheres de meia-idade que iam participar num velório. Todos, sem excepção, bebiam cerveja de forma animada e conversavam como se estivessem num bar de verdade.

Passado algum tempo, este grupo tratou de pagar a conta e caminhou em direcção à tumba onde se iria realizar o funeral. Pelo caminho, conversavam de forma bastante audível, riam-se à toa mesmo perante o olhar reprovador dos que assistiam àquela triste cena protagonizada, sublinhe-se, por pessoas adultas.

Dados que apurámos no local indicam que o assunto está a ser discutido há meses pelas autoridades municipais, responsáveis pelo recinto, as quais afirmam que não lhes falta vontade de ordenar o fecho daquelas barracas, mas são limitadas pelo facto de a venda acontecer a poucos metros do limite coberto pelo cemitério.

Assim sendo, o Conselho Municipal da Cidade de Maputo (CMCM) encaminhou o caso à Administração do Distrito de Marracuene que encarregou a chefia do bairro para tratar do assunto, o que, como era previsível, redundou em fracasso porque aqueles vendedores fincam pé na tese de que se trata de um negócio orientado para a sua sobrevivência.

Enquanto as autoridades trocam responsabilidades, o negócio recrudesce a ponto de ser possível adquirir chamussas, sandes diversas, pratos de arroz, salada e doses de frango, sopa, petiscos, bolos, pão, bolachas, e bebe-se de tudo com ânimo redobrado e só falta música para completar aquele triste e vergonhoso enredo.

Em conversa com alguns utentes daquele cemitério, estes manifestaram a sua preocupação em relação à inércia das autoridades que poderá abrir espaço para o aumento do número de barracas, uma vez que pouco ou nada está a ser feito para eliminá-lo.

Um dos funcionários daquele cemitério disse lamentar o que ali se assiste porque os utentes daquelas barracas se embriagam e protagonizam cenas de baixa índole nos funerais. “É uma vergonha, mas o que vamos fazer? Acho que se devia mandar aquela gente ir vender noutro local. Não faz nenhum sentido ter bancas aqui na entrada”.

Encontrámos o ancião Filipe Marrurele no interior do cemitério e também mostrou-se incrédulo com o desenvolvimento daquele tipo de negócio naquele local.

Já não sei com que mais nos devemos indignar, porque isto é uma aberração sem paralelo. Aquilo é uma total falta de respeito. Não acredito que estejam a vender bebidas alcoólicas ali na entrada do parque de estacionamento por razões de sobrevivência. A sociedade perdeu a moral e o resultado é este”.

Marrurele afirmou ainda que cenário parecido se assiste no Cemitério de Lhanguene, onde as famílias que vivem a paredes meias daquele espaço vão ao extremo de ligar aparelhagens sonoras enquanto famílias inteiras dão o último adeus ao seu ente querido a escassos metros. “Permitimos que isto aconteça e parece que já é uma moda. Ninguém quer pôr fim a esta pouca vergonha”, sublinhou.

Enquanto percorríamos aquele local, encontrámos António Paulo que também considerou que a apetência pelo negócio está a levar alguns cidadãos a perderem a vergonha e o respeito por lugares sagrados. “Não é correcto vender bebidas no cemitério. Acho que se deve tomar medidas porque aquilo é estranho. Não fica bem”.

No mesmo espaço ouvimos uma jovem que se identificou apenas como Sónia e que também não concorda com a venda de cerveja, vinho, tentação, zed, gin e também sopas e petiscos na entrada do cemitério, por entender que quem se dirige àquele local pretende homenagear a um falecido e não conviver como se estivesse em festa.

Para mim a venda de bebidas é o cúmulo da falta de vergonha. Passaram dos limites. O Conselho Municipal deve tomar alguma providência. A minha opinião é de que se deve retirar aquelas pessoas dali. Este é um lugar sensível e não se pode permitir que se venda bebidas”, disse.

Armando Vilanculos, que ouvia a conversa a alguma distância, aproximou-se para dizer que “aqueles devem ser retirados dali. Este local é diferente de discoteca, salão de festas ou jardim onde se namora à vontade. A gente se vem para aqui é porque está em aflição. Perdemos parentes e viemos aqui cumprir com uma agenda fúnebre. Não é sítio adequado para venderem. Não estamos contra eles, mas que procurem outro local”.

Conta-se que recentemente um grupo de adolescentes e jovens embebedou-se naquele espaço enquanto aguardava por um funeral e, quando a urna chegou, alguns integrantes do bando mal conseguiam se pôr em pé. “Um deles caiu durante a cerimónia porque tinha bebido demais”, disse um vendedor de recargas de telefones móveis que não quis que o identificássemos.

UM CEMITÉRIO DIFERENTE

Localizado a sensivelmente 20 quilómetros da cidade capital e inaugurado em Dezembro de 2012, o cemitério de Michafutene ocupa uma área de 50 hectares divididos em 17 talhões para a inumação de pessoas que professam a religião cristã e seis talhões para a comunidade muçulmana.

A infra-estrutura possui condições mínimas para a realização de funerais, nomeadamente arruamentos pavimentados, assim como capelas, rede eléctrica e de abastecimento de água e, aquando da sua inauguração, foi assumido que se tratava de um lugar sagrado, em respeito e memória dos que ali repousam para a eternidade.

Foi apelado às estruturas do distrito de Marracuene e do município de Maputo para a necessidade de se exercer uma melhor gestão do novo cemitério, para que não aconteça uma série de problemas e desrespeito como sucede no “Lhanguene”. Aliás, falou-se até de um plano de gestão do Cemitério de Michafutene, o qual faria com que este fosse completamente diferente.

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