No passado mês de Setembro a Rússia realizou exercícios militares, designados “Vostok 2018”, que foram considerados os maiores desde o desmembramento da União Soviética. Na ocasião, os russos convidaram os chineses a se juntarem às manobras militares. Os exercícios foram interpretados como uma demonstração de força ao “Ocidente”. Um mês depois, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) responde lançando as manobras “Trident Juncture 2018”, também consideradas os maiores exercícios militares da organização desde o fim da Guerra Fria. Curiosamente, o anúncio dos exercícios acontece poucos dias depois dos EUA terem anunciado a intenção de abandonar um acordo nuclear com a Rússia de há mais de três décadas. Estes eventos mostram, mais uma vez, que a premissa de a Guerra Fria ter terminado não passa de uma “ilusão”.
Os manuais de relações internacionais têm retratado a “ilusão” de que a Guerra Fria, conflito que opôs o Leste e o Oeste por quase meio século, terminou no final da década de 1980 e início da década de 1990 do século passado. Tal “ilusão” é consubstanciada pelas mudanças ocorridas em dois dos maiores pilares da Guerra Fria: a queda do muro de Berlim e o desmembramento da União Soviética. Contudo, vários factos do “período pós-Guerra Fria”, agora com destaque para os exercícios militares e a intenção “trumpiana” de abandonar o acordo nuclear, fazem refutar a tese do fim da Guerra Fria. Pode é dizer-se que a dimensão ideológica foi ultrapassada. Porém, os principais actores, as suas motivações e as suas acções continuam os mesmos.
Entre os dias 11 e 17 de Setembro os russos efectuaram manobras militares cuja envergadura nunca tinha sido atingida pela herdeira da União Soviética desde 1991. Se se adicionar o elemento de terem sido conjuntas com a China, isto lembra a configuração de alianças do período da Guerra Fria onde o Pacto de Varsóvia contrabalançava a OTAN. Enquanto o Pacto de Varsóvia foi dissolvido após o desmembramento da União Soviética, a OTAN continuou a operar e até a tentar encurralar a Rússia, “roubando-lhe” os seus anteriores aliados. O “encurralamento” ocorreu por via de uma política deliberada de incentivar os antigos aliados da União Soviética a juntarem-se à UE e à OTAN. Portanto, as manobras militares conjuntas com a China podem ser percebidas como a tentativa russa de estabelecimento de uma “aliança militar” que possa dissuadir os seus adversários da OTAN que continuam a “namorar” as suas antigas esferas de influência.