Sob protestos e ameaças de Washington, Ankara faz “ouvidos de mouco” e “aproxima-se” cada vez mais de Moscovo. O ministério da defesa da Turquia anunciou, semana passada, o desembarque, numa das bases do país, de parte do equipamento de um sistema de defesa anti-aérea adquirido na Rússia. Designado S-400, a questão da aquisição do sistema russo foi sempre motivo de crispação entre a Turquia e os EUA, tendo estes últimos feito “tudo que esteve ao seu alcance” para boicotar a materialização do negócio entre Ankara e Moscovo. Porém, ignorando os apelos e ameaças dos EUA, a Turquia seguiu em frente na sua decisão e, portanto, com o anúncio antevê-se um elevar da tensão entre Ankara e Washington. A desavença turco-americana em torno das anti-aéreas russas pode ser analisada sob duas perspectivas: a das razões por detrás da insistência turca em obter o sistema russo sendo aliado dos EUA, por via da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), por um lado, e as motivações que levam os EUA a objectarem o negócio russo-turco quando, aparentemente, pode haver uma vantagem para Washington.
A Turquia esteve “sempre” do lado dos EUA e da Europa Ocidental desde a sua adesão à OTAN em 1952. Num período marcado pela ocidentalmente considerada guerra-fria, a adesão turca à OTAN significava a tomada de posição turca no contexto da confrontação entre os EUA e a antiga URSS. Aliás, a própria OTAN foi estabelecida como um fórum, a par do Pacto de Varsóvia, de consultas de concertação de estratégias tendentes a manter a segurança entre os seus membros combatendo o “inimigo comum”. Diferentemente do Pacto de Varsóvia, que pereceu, a OTAN sobreviveu ao fim da guerra-fria e as suas atenções continuaram a concentrar-se na herdeira-mor da extinta União Soviética, a Rússia, que continua a ser considerada a maior ameaça à Aliança.
Pelo exposto no seu site oficial do ministério dos negócios estrangeiros, a Turquia diz estar comprometida com os princípios de indivisibilidade da segurança da Aliança, solidariedade entre os seus membros e justa partilha de risco e fardos bem como a regra de consenso. Com efeito, a Turquia atribui uma elevada importância ao papel da OTAN na manutenção da segurança e estabilidade na área Euro-Atlântica e no estabelecimento de um fórum de consultas político-militares em assuntos de interesse dos seus membros. Ainda que o país herdeiro dos resquícios do império otomano “jure” fidelidade aos valores da OTAN, as suas atitudes não parecem evidenciar isso. Aliás, o declarado engajamento turco aos princípios da OTAN está a ser questionado pelos “seus aliados”, particularmente os EUA. O anúncio da materialização da compra das anti-aéreas russas evidencia, portanto, a ausência de confiança que existe entre a Turquia e os seus aliados da OTAN. Leia mais…
Por Edson Muirazeque *