Texto de Jorge Rungo e Fotos de Juma Capela
A Aliança para a Inclusão Financeira (AFI) deliberou na semana passada, em Maputo, dedicar os seus esforços para virar o jogo financeiro a favor das Pequenas e Médias Empresas (PMEʼs) e das mulheres, por entender que estes dois grupos são os verdadeiros motores da economia global no que se refere à geração de emprego e de renda.
O mundo finalmente despertou para uma realidade que há muito parece óbvia. Os mega-projectos são excelentes para dar musculatura ao Produto Interno Bruto (PIB) dos países. Mas, quando o assunto é gerar renda e emprego, são as Pequenas e Médias Empresas (PMEʼs) que aparecem na primeira fila.
Segundo foi referenciado na reunião de Maputo, a diferença entre os mega-projectos e as PMEʼs reside no facto de as primeiras serem de capital intensivo e as segundas serem de mão-de-obra intensiva, o que por si só revela que que é muito mais vantajoso ter PMEʼs em abundância.
A par das PMEʼs, as mulheres começam a ser vistas como um grupo que sabe lidar com dinheiro, particularmente no quesito poupança e gestão de pequenos e sustentáveis negócios. Porém, estudos recentes indicam que cerca de 70 por cento da população feminina africana, por exemplo, não tem acesso ao sistema financeiro.
Para falar sobre a necessidade da AFI incluir nos seus debates as questões de género, esta agremiação convidou a moçambicana Graça Machel que não deixou seus créditos em mãos alheias e chamou a atenção do mundo para o facto de este estar “repelir” exactamente o extracto social que mais faz pela economia global.
Foi perante estes e outros indicadores que mais de 450 representantes de bancos centrais de quase todo o mundo se reuniram na semana passada em Maputo, no encontro da AFI para rever as suas posições a respeito dos excluídos da banca formal.
Neste encontro, foi reiterado que grande parte da população mundial não tem acesso a serviços financeiros porque não possui documentos de identificação, não sabe como aceder, desconfia dos bancos, considera o processo difícil, entre outros argumentos.
Quando o assunto é fazer uso do dinheiro para gerar emprego e renda as dificuldades ampliam-se de forma exponencial a ponto de pequenos e médios empresários desistirem por falta daquilo a que na linguagem bancária se chama de garantias ou colaterais.
Para contornar estes condicionalismos, os participantes da reunião mundial da AFI sugeriram que se adoptasse as novas tecnologias como alternativa à banca formal, onde os chamados excluídos dos serviços financeiros poderiam se escudar e desenvolver as suas actividades tranquilamente.
Porque urge reverter este quadro, o Chefe de Estado moçambicano, Felipe Nyusi, comprometeu-se perante os participantes daquele fórum a tudo fazer para expandir e fortalecer os serviços financeiros inclusivos para que o país reduza o número da população activa sem acesso à banca.
Disse que enquanto presidente de Moçambique orientará o governo para “acelerar a expansão do acesso a energia eléctrica e aos serviços de telecomunicações, sem os quais é impossível expandir e prover os serviços financeiros”.
Por outro lado, sublinhou que pretende “aprimorar e garantir a implementação efectiva do quadro legal e regulamentar, robusto e sustentável que incentive o pleno funcionamento e dinamização dos mercados e serviços financeiros”.
Para o alcance deste objectivo, Filipe Nyusi disse que o governo definiu como prioridade tornar física e economicamente acessíveis os serviços financeiros para a população moçambicana necessitada e em toda a extensão do nosso território, com particular ênfase para os produtores nas zonas rurais.
É neste contexto que o Moçambique tem vindo a trabalhar para garantir que o nosso país tenha um sistema financeiro robusto, inclusivo e funcional, e que seja resiliente aos riscos provenientes de choques internos e externos.
“Igualmente, comprometemo-nos a manter e reforçar as medidas de política visando dinamizar a bancarização e a expansão do acesso aos serviços financeiros às zonas rurais, a aumentar e massificar o uso de meios alternativos de pagamento e a promover maior abrangência, diversificação e competitividade dos serviços financeiros”, enfatizou.
REDUZIR OS EXCLUIDOS ATÉ 2022
Com o compromisso assumido pelo mais alto magistrado da nação moçambicana, o governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove deu a conhecer os caminhos que o governo está a seguir, em termos de política, para alcançar aqueles objectivos.
Gove falou das “experiências e desafios da inclusão financeira em Moçambique” e disse que Moçambique possui um Programa Quinquenal do Governo, para o período de 2015 até 2019 que prevê o desenvolvimento de uma conduta funcional do mercado e o fortalecer o papel da supervisão bancária.
No mesmo programa quinquenal está prevista a manutenção dos incentivos para promover a bancarização da economia, o incremento e massificação do uso de meios alternativos de pagamento, assim como promover um maior alcance, diversificação e competitividade dos provedores de serviços financeiros.
Com estas medidas, e fazendo uso da Estratégia de Desenvolvimento do Sector Financeiro, que está a ser implementada desde 2013, com prazo de validade que expira em 2022, Ernesto Gove disse que o que Moçambique tem como meta é promover a diversidade, competitividade e inclusão do sector financeiro.
“Até 2022 pretendemos que pelo menos 35 por cento da nossa população activa tenha acesso físico ou electrónico fornecido por pelo menos uma instituição financeira formal”, disse e a sala aplaudiu. Era este o compromisso que os 450 delegados queriam ouvir do anfitrião.
DECLARAÇÃO DE MAPUTO
A realização deste tipo de reunião culmina sempre com a produção de uma declaração e, no caso vertente, a de Maputo trás resultados que Ernesto Gove classifica de muito concretos, uma vez que o assunto central é a inclusão financeira que é um instrumento fundamental para a dinamização da economia por ser geradora de renda e da eliminação gradual do desemprego.
“Nesta reunião fizemos uma extensão da Declaração de Maya que se vai chamar de Declaração de Maputo que tem um enfoque na criação de condições para o financiamento das Pequenas e Médias Empresas porque se reconhece que este sector é muito importante para a criação de emprego e na inovação”, disse.
Por outras palavras, o que vai acontecer a partir de agora é que os membros da Aliança para a Inclusão Financeira (AFI) vão prosseguir com trabalhos em grupo visando a identificação de soluções financeiras mais ajustadas a este sector da economia.
“Portanto, será a configuração de soluções financeiras porque os problemas que este sector enfrenta que tem a ver com as exigências normais do crédito formal que requerem a existências de garantias reais para a obtenção de crédito e a maioria dos empresários não tem essa garantia e é preciso que se reconheça que sendo importante para a geração da renda e para a eliminação gradual do desemprego temos que encontrar soluções alternativas”, sublinhou.
Como grupo, a AFI estabeleceu para si a meta de até 2019 atingir um nível de inclusão financeira de 25 por cento. Actualmente todos os países da agremiação apresentam uma média de 23 por cento. “Tudo está a ser feito para o alcance deste objectivo”, garante Gove.
AGIR SEM MEDO DE COMETER ERROS
A reunião de Maputo produziu muitas outras decisões, com destaque para a inclusão do Banco Central da Rússia num dos comités de executivos, assim como a retirada da GIZ, uma organização alemã, que incubou esta iniciativa nos primeiros sete anos que passa para uma outra posição, deixando o seu lugar à disposição da Indonésia.
“Decidimos aceitar novas economias emergentes e mais desenvolvidas para que possamos estabelecer uma plataforma onde podemos comprometer-nos sem que todos sejamos necessariamente membros. E gostaríamos de ter algumas agremiações regionais como a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) que desempenham um papel na coordenação regional e harmonização de regulamentos regionais com impacto na inclusão financeira”, disse Alfred Henning, director executivo da AFI.
Na componente inovação, Hanning disse que a AFI precisa abraçar quatro elementos, nomeadamente ter aspirações e, sempre que puder, não ter receio de ter grandes ambições. Em segundo lugar, “queremos fazer mudanças, pelo que devemos fazer mudanças no quadro regulador para nós mesmos”.
Mais adiante Hanning disse que em terceiro lugar a AFI deve reservar espaço para experimentar sem limitações e, para isso, precisa de ter vontade e estar pronta para cometer erros, porque nem tudo o que for feito como inovação terá êxito.
No quarto âmbito, o director executivo da Aliança para a Inclusão Financeira disse que a Declaração de Maputo dá particular enfoque ao financiamento às PMEʼs, pelo que este tema e outros como o género e fontes de financiamento devem devem ser incorporados nas agendas de cada país, o que Moçambique já fez há anos.
Ainda durante aquela reunião, o comité executivo recebeu uma sugestão do Banco da Zâmbia para criar um grupo de trabalho que lide especificamente com os mecanismos de financiamento às PMEʼs. Na mesma ocasião, os representantes dos bancos centrais do Ruanda, Lesotho e Quénia manifestaram interesse em juntar-se a este grupo.
Alfred Hanning, que não se cansou de afirmar que a reunião de Maputo foi bem-sucedida mencionou que este sétimo encontro ajudou a consolidar a ideia de que o financiamento sustentável é uma questão crucial para todos e que uma coordenação estreita, com consultas junto dos reguladores é muito importante, pelo que deverá ser incluída na agenda da AFI.
Entre outras actividades, a VII reunião da AFI, realizada na semana passada foi caracterizada por sessões paralelas nas quais houve um grupo que discutiu a necessidade de se ter enfoque no consumidor.
Também foi discutida a possibilidade de criação de uma biblioteca digital, melhoria recolha, processamento e divulgação de dados sobre inclusão por desagregados por género, necessidade de prestação de assistência aos países que ainda enfrentam dificuldades para a implementação e definição de estratégias, entre outros.
Fotos de Juma Capela
Texto de Jorge Rungo