Creve Armando Machava, 18 anos, corre mais rápido que todos os outros atletas moçambicanos, quer em provas planas, quer em provas de barreiras e saltos. É a revelação do atletismo nacional. É campeão nacional dos 100, 200 planos e 400 metros barreiras, em seniores. Campeão nacional dos 100 metros planos, 110 e 400 metros barreiras, em juniores. Títulos referentes ao ano de 2014, obtidos nos campeonatos nacionais realizados em Moatize, Tete.
É jovem de poucas palavras mas dono de si. Não se atrapalha no que diz e no que faz. Em Abril deste ano, ao receber o troféu de “Atleta Revelação de 2013” disse que graças a ele próprio estava sendo distinguido.
Aos dez anos entrou para o desporto. Um dia, na companhia de amigos de infância, viu a sua irmã a chegar com cadernos, lápis, camisete e boné, tudo trazido do atletismo. Então, com os seus amigos, foram a correr para a escola ter com o treinador Alberto, mais conhecido por Quenhane, para também praticarem o atletismo.
Muito cedo a rapaziada percebeu que não bastava manifestar interesse em praticar o atletismo para merecer objectos iguais aos ganhos pela irmã de Creve. Era preciso treinar, competir e ganhar. Meteram mãos à obra Pelo caminho uns foram desistindo. Dos que perseveraram se destacou Creve, já com participações regionais, continentais e mundiais.
Ele próprio sabe que ainda é cedo para qualquer concretização de certos sonhos, mas não dorme, porque está ciente de que nada lhe chegará numa bandeja. Em participações nacionais e internacionais procura sair com bons resultados. Por diversas vezes passou pelo pódio internacional, onde só o primeiro lugar lhe vem escapando.
Faltam condições
Embora já comece a gostar da “doçura” do desporto, Creve continua a acreditar que a melhor garantia de futuro melhor está nos estudos. Frequenta a décima classe na Escola Primária de Magoanine, no curso nocturno.
O que significa o atletismo na sua vida? Creve demora a responder e quando o faz começa por dizer “ é difícil…é quase que significasse tudo. O que sou é graças ao atletismo.”
O que já é Creve? É simplesmente o atleta mais veloz de Moçambique, com o tempo de 10.4 segundos nos 100 metros planos e… Mas para ele isto não chega.
“ Pretendo ser campeão africano. Ter títulos africanos”, observa.
Acha que é possível? Creve responde afirmando que “acredito que sim. Trabalho para isso.”
Mesmo acreditando que ele pode um dia sagrar-se campeão africano, Creve considera que no país ainda é difícil ser-se aquilo que se sonha.
“É difícil. Se tivesse condições desenvolveria mais as minhas capacidades. Tenho bom treinador, mas não tenho boas condições.”
Creve foi um dos atletas escolhidos pelo Comité Olímpico de Moçambique para gozar bolsa de solidariedade olímpica, com vista a qualificação para os Jogos olímpicos de Rio de Janeiro (Brasil), em 2016. Vai para o Senegal.
“A bolsa por si só já é uma coisa boa para a minha carreira. Será benéfica. Irei melhorar. Vou seguir o objectivo da mesma, que é conseguir os mínimos para os jogos olímpicos do Rio de Janeiro.”
Na sua família não há pessoas destacadas pela prática de desporto. Mas encontra nela carinho motivador, que lhe faz correr mais e melhor.
“Tenho a minha família perto de mim. Me apoia. Dá-me força. Diz-me para não desistir de correr. Quando ganhei o terceiro lugar africano me apresentei em casa com o dinheiro que o Estado me deu de prémio, cujo valor não importa hoje referir.”
Diz que dantes se inspirava no seu ídolo Titos Nhancila, mas reconhece que Kurt Couto “é melhor atleta moçambicano, o melhor dos quatrocentos (400) metros barreiras, a prova que mais adoro.” Aliás, aos poucos ele vai sendo o sucessor legal e merecido de Kurt Couto, este que já atravessou os 30 de idade.
A nível mundial admira o jamaicano Usain Bolt, nos 100 e 200 metros planos, e o americano Aires Mart, 110 metros barreiras.
“Antes acreditava mais nos 200 metros planos, mas agora me foco mais nos 400 metros barreiras”, confessa.
Gosta da música reppe. É admirador do músico moçambicano Azagaia e do brasileiro Gabriel Pensador.
Namora? “Uma vez a outra. Não tanto!”
Droga-se? “ Não.”
Fuma? “Não.”
Bebe? “Água sim, álcool não.”
Que mais gosta de comer? “ Como tudo de bom.”
Carreira muito promissora
O ciclo evolutivo de Creve Machava não é mau. Há indicações de que a sua carreira é promissora. O país, se investir nele, pode também muito esperar dele. Vontade de chegar longe com bandeira nacional não lhe falta.
Sua carreira começou num modesto clube que depois faliu, denominado Maputo Atlético Clube, por onde passou Kurt Cout.
“Quando aquele clube faliu, o treinador Quenhane criou o núcleo do Maxaquene que durou dois anos. O “mister” fez parceria com o Ferroviário de Maputo, clube que passei a representar desde 2010 até hoje. Era juvenil mas já fazia provas de juniores. Aqui no Ferroviário primeiro fui treinado pelo “mister” que me trouxera do bairro. Quando ascendi ao escalão de juniores passei a ser treinado por Samuel Azarias.
Sua internacionalização começou no Botswana, onde representou o país no Campeonato Regional de Juvenis, tendo ficado em oitavo lugar no salto em cumprimento e em 4º lugar nos 110 metros barreiras. Em 2010 participou nos Jogos da CPLP aqui em Maputo, obtendo nos 100 metros planos a quinta posição com o tempo de 12.02 segundos. Em 2011, na Namíbia participa no Campeonato Regional de Juvenis, ficando em 5º lugar nos 110 metros barreiras.
Ainda na senda dos campeonatos regionais, Creve em 2012 foi ao Zimbabwe ficar em 6º lugar nos 100 metros planos, com o tempo de 11.11 segundos, na final. Ainda no Zimbabwe, classificou-se em 5º lugar na prova de 200 metros planos, com o tempo de 22.23 segundos.
Num salto para a Europa, Creve participa nos Jogos da CPLP em Portugal. Fica em 3º lugar nos 100 metros planos, com o tempo de 11.38 segundos. Nos 200 metros planos quedou-se em 5º lugar, 22.29 segundos. E fez 6.44 metros na prova de salto em cumprimento, que lhe valeu o 2º lugar. No mesmo ano, na Zâmbia, nos jogos da SCAZA correu os 110 metros barreiras em 15.09 segundos; nos 200 metros planos ficou em quinto lugar e no salto em cumprimento fez marca de 6.36 metros, sétima posição.
O ano passado, 2013, deslocou-se a Nigéria para os campeonatos africanos de juvenis. Com o tempo de 14.31 segundos nos 110 metros barreiras consegue qualificação para o Campeonato do Mundo de Juvenis, na Ucrânia, onde não pode ir por causa de problemas de visto.
Ainda o ano passado, no Botswana, no campeonato regional sénior, nos 400 metros barreiras classificou-se em 3º lugar com o tempo de 53.50 segundos. Nos 100 metros planos quedou-se em 5º lugar com 11.04 segundos.
Segue para o Campeonato Regional de Juniores, nas Maurícias. Nos 110 metros barreiras o tempo de 15.50 segundos, 6º lugar, sem ter chegado à final. No mesmo campeonato conseguiu o 6º lugar na final dos 400 metros barreiras, com o tempo de 54.38 segundos.
Este ano, 2014, nos Jogos da Lusofonia, realizados no Estado de Goa, na Índia, Creve deu recado do seu futuro. Na prova dos 400 metros barreiras conseguiu o segundo lugar, com o tempo 54.44 segundos. Quem ficou em primeiro? Kurt Cout. Esteve na África do Sul, no “Regional” de juniores, donde trouxe a medalha de bronze dos 400 metros barreiras, com o tempo de 52.50 segundos, o suficiente para se qualificar para o Campeonato do Mundo, em Júnior, realizado nos Estados Unidos de América, onde fez, na semi-final dos 400 metros barreiras, o tempo de 51.97 segundos, o seu melhor tempo de sempre. O futuro se verá no longo percurso que ficou.
Está a evoluir bem
-Azarias Samuel, treinador
Para o treinador Azarias Samuel, o seu pupilo está a evoluir satisfatoriamente e promete muito ao desporto nacional.
“Creve é um atleta promissor e disciplinado. Gosta do atletismo e procura algo mais que ser campeão nacional nesta e aquela especialidade. Apesar da sua principal especialidade ser a prova dos 400 metros barreiras, pelo qual foi ao “mundial” de juniores nos Estados Unidos de América, onde melhorou o tempo de 52 para 51.97 segundos, tem os melhores tempos de actualidade dos 100 metros planos, 10.4 segundos, e dos 200 metros, 21.4 segundos. A sua marca pessoal nos 400 metros planos é de 48.5 segundos.”, Azarias Samuel.
“Ainda bem que vai gozar bolsa de olímpica. Talvez lamentar pelo facto de não ter havido consulta ao clube e aos pais antes da indicação do país a ir estagiar em gozo dessa bolsa. No Campeonato do Mundo em que participou nos Estados Unidos de América, só estiveram três países de África, nomeadamente Moçambique, Maurícias e África do Sul, todos representados por um atleta. Não Esteve lá o Senegal, donde nunca se ouviu de alguém que tenha se destacado internacionalmente na prova dos 400 metros barreiras. Vamos acreditar que no Senegal existam especialistas no treinamento de atletas dos 400 metros barreiras”, conclui o treinador.
Manuel Meque