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Inveja: o meu pecado para com o Cândido Coelho

Por admin

Quis ler esta mensagem no velório, mas as condições não eram as melhores. Aproveito este espaço para divulgar o que me vai na alma e que deveria ter lido na altura das cerimónias fúnebres.

 Aí vai:

Eu tenho uma pequena confissão a fazer, após a morte de Cândido Coelho:

Pequei!

Pequei, porque quando tinha 18 anos, era eu um modesto atleta do Sporting de Lourenço Marques, mas morria de inveja por ficar em penúltimo ou mesmo no último lugar nos 100 e 400 metros planos “assistindo”, impotente, às verdadeiras cavalgadas do “alvi-negro” Cândido Coelho em direcção à meta.

E pequei ainda mais porque via o Becas, decatlonista- mór de todo o espaço português – a ganhar o salto em altura, o salto à vara, os 3.000 metros obstáculos, lançamentos e por aí fora…

Mas ele não se ficava por aí. Ainda me criava mais ciúmes e mais raiva, porque era um goleador no futebol, estrela na ginástica e no basquetebol.

E eu ficava com inveja. Com muita inveja. E a inveja, tenho que admitir, é um grande pecado.

Por isso me confesso agora!

Mas há mais! Nos intervalos deste estrelato e como se não bastassem os feitos, era ver o Cândido Coelho a dar cartas no hóquei em patins e no futebol de salão. Ah! Ia-me esquecendo: ele foi um dos melhores ginastas da Associação Africana.

Na verdade, ele foi o atleta mais eclético entre os muito ecléticos.

CIFRÕES NÃO O SEDUZIRAM

O Cândido “escapou” ao voraz apetite dos grandes clubes portugueses, neste caso o Benfica de Lisboa, em 1973, devido ao serviço militar. E quando as luzes da ribalta, em 1975 se abriram para um profissionalismo em Portugal, o compromisso em servir o seu país recém-independente falou mais alto. Aí, os cifrões ficaram para trás, o Becas recusou-os, numa clara demonstração de que as suas qualidades de desportista-mor iam bem para além das pistas e dos campos.

Cândido de Sousa Coelho, deveria ser para nós, uma lenda. Coisa que não temos o hábito de cultivar e nem venerar. Mas vamos aceitá-lo como uma legenda, uma legenda que não teve um ponto final.

Becas, velho amigo, que nunca será um amigo velho!

Nesta hora em que nos deixas, fica esta confissão:

De facto, olhei para ti e pequei várias vezes.

– Pequei quando tive inveja de te ver treinador campeão nacional pelo Desportivo;

-Pequei quando te senti dirigente galvanizador.

Mas também me orgulhei:

– Fiquei feliz quando te vi marido e pai extremoso;

– Senti-me encorajado quando me incentivaste a não esmorecer na trilha de trazer sucessos desportivos ao nosso País;

Na hora do adeus e por aquilo que fizeste pelo nosso desporto e pela nossa terra, deixo o meu apelo aos compatriotas que por cá ficam:

– Por favor: estudem, pesquizem e valorizem a vida e obra deste super-talentoso filho da terra.

 

– Por favor, não matem em poucos dias a morte do Becas. Ele merece permanecer connosco. E se eu confesso que pequei, creio bem que há entre nós muitos outros pecadores!

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