O dia-a-dia dos que trabalham em cidades e vilasé muito corrido. Vezes sem conta, por estarem distantes de casa e por não trazerem consigo o “mangungo” (marmita), as pessoas têm de passar as suas refeições em restaurantes, bares, barracas e até comprar os ditos “street food”, diferentes tipos de comidasvendidas em carros transformados em restaurantes ambulantes, que se espalham pelas ruas de Maputo.
No entanto, apesar de a gastronomia assumir um papel muito forte na identidade cultural de um povo e constituir um meio de ligação entre os povos, alguns dos pratos tipicamente moçambicanos como cacana, folhas de abóbora (mboa), nhangana (folhas de feijão-nhemba), dledlele (folhas de batata-doce), couve, matapa, tseke, entre outros, são ainda postos de lado.
Por conta disso, o menu dos lugares acima referenciados é habitualmente composto de carnes, mariscos, hambúrgueres, batata frita e pizzas, muitas das comidas importadas de culinárias como a portuguesa, indiana, brasileira, americana e Italiana, sendo as duas primeiras consequência das relações históricas que Moçambique teve com os dois países.
Foi a pensar nesta pouca valorização cultural e com vista a trazer o tipicamente moçambicano ao de cima, que há quatro anos, Tia Aissa, vendedora e cozinheira do Mercado do Povo, teve a ideia de confeccionar apenas comidas originariamente moçambicanas.
Na sua mesa só cabem folhas de abóbora, nhangana, matapa, couve, cacana, tihacana (frutos de cacana), acompanhadas de xima ou arroz. O resultado disso é bastante notável. É que esta cozinheira é um verdadeiro íman para os aficionados pela culinária moçambicana.
Fixada no Mercado do Povo há 23 anos, Tia Aissa trata os seus clientes com muita estima e até atribui algumas designações familiares tais como papá, filho(a), amor, querida(o), tudo para que estes se sintam acomodados. Segundo ela, quem come na sua barraca tem a dieta bem equilibrada pois “faço comida saudável e com muito amor. A saúde e o regresso às origens dos meus clientes são uma prioridade. Daí a razão de buscar comidas tipicamente moçambicanas, que os restaurantes e demais locais têm dado pouco crédito”.
De estatura alta, airosa e de uma genética impressionante, Tia Aissa toma conta das panelas sozinha. Residente nos arredores da Cidade de Maputo, nossa interlocutora levanta as 4:00 horas e chega ao mercado por volta das 6:00 horas para garantir que até à hora do almoço tudo esteja pronto.
Diariamente faz pelo menos quatro a cinco variedades de pratos de modo que os seus clientes tenham várias opções. “Nos meus pratos só uso coco e amendoim. E porque nem todos gostam de coco faço outros só com amendoim. Mas em nenhum misturo com óleo”, alertou.
Acrescentou que não vende álcool e não admite que levem para sua barraca. Mas aceito que tragam refrigerantes e a água é por conta da casa.
FALTA DE CADEIRAS
NÃO DESMOTIVA
Durante 19 anos a nossa interlocutora dedicava-se apenas à venda de várias verduras. No entanto, quando constatou que os seus clientes já não a procuravam por causa da concorrência no mercado informal, teve então de mudar de estratégia. Para além de vender, passou igualmente a cozinhar as verduras. “Olha que sai a ganhar mais pois não tive de ficar em casa e ainda conquistei outro tipo de clientela”, rematou.
O espaço no qual tia Aissa trabalha é muito pequeno e muitas vezes uns clientes têm de ficar à espera dos outros para conseguirem lugar. Curiosamente, eles não se incomodam em passar as refeições de pé basta degustar das boas comidas moçambicanas e saudáveis, conforme diz Bachir Macassa, cliente da Tia Aissa, há três anos.
Segundo Bachir Macassa,cuja rotina diária o obriga a passar as refeições longe do seu lar, Tia Aissa para além de cozinhar bem, aplica preços acessíveis para qualquer bolso. Um prato de qualquer comida aqui custa-nos apenas 50 Meticais, disse.
Mais adiante referiu que descobriu aquele espaço por acaso e desde então “alojei-me” aqui. De segunda a sexta-feiras passo as minhas refeições aqui.
Por seu turno, Sérgio Ferreira avançou que há necessidade de valorizar mais os pratos tipicamente nacionais pois fazem bem a saúde. Comecei a frequentar este lugar há três meses a convite do meu colega. Deste então, tenho vindo duas a três vezes por semana.
Moisés Jalane é fanático de folhas de abóbora e igualmente cliente da Tia Aissa. Começou a frequentar aquele espaço há três anos. Este é o local ideal para os que querem fugir das comidas feitas à base de óleo, que a maioria dos locais de confecção de comida habitualmente oferece. Faço questão de mostrar sempre aos colegas e amigos que queiram valorizar o que é nosso e também manter a boa forma, afiançou.
Maria de Lurdes Cossa
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