Texto de Belmiro Adamugy
A excelente prestação moçambicana, no Women`s Theatre Festival, evento cultural que decorreu em Alexandra, Johannesburg na vizinha África do Sul, valeu à trupe nacional dois convites para igual número de festivais teatrais a terem lugar, naquele país, no próximo ano, em Johannesburg e Grahmastown.
Eleita, pela organização, a melhor peça do festival, Psicose 4:48, adaptação, a partir do original da inglesa Sarah Kane, e direcção de Maria Atália Combame, interpretação de Milsa Ussene e música de Rolando Lamussene, conta a história de “Saranyana”, mulher que vive no limite da sanidade mental e da loucura, que acredita piamente que a morte é a sua derradeira vitória sobre os problemas que a afectam.
“Psicose 4:48” foi também eleita a melhor peça do festival pelos espectadores; Outras peças que desfilaram no festival: Distant Faces de Ntshieng Mokgoro, direcção da moçambicana Maria Atália; Sugary Spice de Philiswe Twijnstra; What the water gave me de Jade Bowers; Unwanted Guests dirigida por Nicole Masuku; She Cold encenada pela Milicent Tintswalo; Love and War de Doreen Masuko; High Heels & Blisters de Ntabiseng Seane; Girls in their Sunday Dresses de Karabelo Lekalake; Goodsoul de Fisiwe Mdluli e Eidos de Maude Sandham.
Aliás, na derradeira sessão – Psicose foi exibida duas vezes – o público não só aplaudiu longamente a actuação do grupo moçambicano, como também fez questão de interagir com a encenadora, a actriz e o músico.
Os espectadores elogiaram a performance da actriz e do músico bem como a direcção geral da peça. Colocaram questões relacionadas com as opções técnicas bem como o significado de alguns símbolos usados na peça. A questão da língua (a versão original foi interpretada em português e para o festival foi feita uma versão em inglês) não foi colocada como obstáculo porquanto, segundo um dos espectadores “o teatro de per si é uma língua universal”.
Também consideraram o espectáculo bastante inovador e com elevado padrão de qualidade, para além de prender a atenção em toda a sua extensão. Refira-se que os mesmos argumentos foram referidos pela organização na justificação da indicação da peça moçambicana como a melhor proposta que passou pelo Festival.
Ntshieng Mokgoro, directora do Women´s Thaetre Festival, disse ao domingo que “o grupo moçambicano mereceu a honra porque mostrou um trabalho de grande qualidade técnica e artística. Maria trouxe para o festival uma proposta diferente, rica e que conquistou também a simpatia do público”.
Acrescentou que produtores de outros tantos festivais já manifestaram interesse em ter acolher nos seus eventos a peça. “Próximo ano, queremos ter esta peça no festival que teremos em Março aqui em Johannesburg. Os organizadores do Festival de Gramastowan também querem esta peça lá. Acho que é a prova viva de que a proposta agradou a muita gente”.
Refira-se que para além de Psicose 4:48, a encenadora moçambicana também dirigiu a peça “Distant faces” escrita pela sul-africana Ntshieng Mokgoro e interpretada por actores daquele país. “Distant faces” foi escrita a partir do romance “Terra Sonâmbula” de Mia Couto.
Para a III edição do Festival inscreveram-se mais de 30 peças das quais foram seleccionadas 10 que preencheram a programação, a par de espectáculos musicais e oficinas de direcção, argumentação e sessões de cinema.
Valorizar a mulher
O objectivo central do Women´s Theatre Festival é dar visibilidade a mulher nas artes cénicas. Ntshieng Mokgoro, mentora do festival e directora do Olive Tree Theatre Productions entidade que organiza o festival, diz que na África do Sul a voz da mulher está “amordaçada”.
“O festival visa dar uma oportunidade para as mulheres mostrarem as suas habilidades na direcção de espectáculos teatrais. Infelizmente é verdade; dirigir peças teatrais continua a ser um mundo masculino. Aqui, as mulheres podem mostrar as suas histórias numa perspectiva feminina”, disse Mokgoro, ela também várias vezes premiada incluindo com o Standard bank Young Artist Award for Directing em 2009.
A nossa entrevistada acredita que o Festival é uma plataforma importante para que as mulheres mostrem as suas habilidades nas artes cénicas, quer actuando mas, sobretudo, dirigindo outras mulheres e homens “para contarem histórias interessantes que, de outro modo, estariam condenadas ao eterno anonimato”.
NkotoMalybye, professora de teatro na Tshwane University of Technology, que já participou numa das edições, diz que “vi,como mulher, que as minhas oportunidades eram muito limitadas por isso era importante para mim estar envolvida neste festival.”
Malybyetem formação em teatro comunitário, na província de Mpumalanga e está ciente do poder de teatro como uma ferramenta educacional. Embora este ano não tenha mostrado nenhuma peça, diz que se envolveu, uma vez mais com Festival, porque é sua crença de que o teatro pode mudar percepções no mundo e sobre o mundo.
DenelHoneyball, também acredita que "sim a maioria das organizações de teatro são dirigidas por homens, mas isso é uma herança do nosso passado. Eu olho para o público e vejo jovens ansiosos por se divertirem. Esta audiência está sempre aberta a assistir produções de e sobre mulheres. Isso é importante porque é assim que você pode mudar o futuro sem ficar preso no presente."
Ofestival enfrenta crises de financiamento, desde o início, mas Kerry Irvin e Ntshieng Mokgoro estam determinadas a mantê-lo em Alexandra, uma cidade a nordeste do centro da cidade de Joanesburgo, Gauteng. Além de dar uma plataforma para directoras, a dupla sente que é tão importante trazer a experiência do teatro para os moradores de Alexandra.
"No início queríamos manter o Festival na Escola Nacional de Artes em Braamfontein (Joanesburgo), mas pareceu-nos que Alexandra precisava mais deste tipo de actividade. Fizemos demarches neste sentido e já vamos na terceira edição do festival e sempre em crescendo”, diz Irvin co-mentora do Women´s Theatre Festival.
O Tree Theatre Olive Productions, fundado há 10 anos, está alojado em um armazém no Centro Yarona, um shopping Center em Alexandra. Beneficiam daquele espaço jovens das comunidades próximas do local que, ali, têm oportunidade para desenvolverem as suas habilidades quer no teatro, pintura, música entre outras actividades artísticas.
Ntsienge Kerryn têmplanos para produzir e realizar um festival de teatro infantil e realizar exposições de arte criada em Alexandra. Antes, porém, esperam que o Festival de Teatro da Mulher leve a um renascimento do teatro em Alexandra e atrair um novo público.