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Daúto Faquirá: “A pintura ajuda-me a pensar melhor o futebol”

Por admin

Continua a ser treinador de futebol – e quer voltar ao ativo – mas tem sido no papel de comentador desportivo que mais o temos visto e ouvido nos últimos anos, tempo em que também tem explorado a sua faceta de artista, para muitos desconhecida

 

Vai praticamente todos os dias ao ginásio e nunca menos do que hora e meia. Tem uma filha que está a estudar música em Inglaterra, depois de ter participado no programa "The Voice", da RTP. O filho, mais puto, é maluco por bola e acompanha o pai nas maratonas televisivas de futebol. Daúto Faquirá está há cerca de dois anos sem clube, mas a sua vida continua muito preenchida, inclusive pela pintura, um dos seus hobbys desde que se lembra de ser gente.

Porque começou a pintar?

Sempre pintei, com cinco, seis anos, ainda em Moçambique, fazia os desenhos do Damas e do Eusébio. Lembro-me de, na escola, ter sido escolhido para fazer uns desenhos do Samora Machel e do Eduardo Mondlane, na altura da independência.

Já nasceu com o dom?

Sim. Foi sempre autorrecreação. No segundo ciclo, umas professoras aconselharam-me a seguir belas-artes. Gosto imenso, mas a minha paixão é o futebol.

Que papel tem hoje a pintura na sua vida?

Acalma-me imenso. Mas é, ao mesmo tempo, extremamente compulsiva. Tenho alturas intensas, vejo alguma coisa que me inspira, vejo o trabalho de outros pintores, e não descanso enquanto não acabo. Tenho muitos desenhos da minha mulher Luísa, ela queixa-se que a desenhava mais quando namorávamos [risos]. Gostava de montar um atelier enorme, onde pudesse brincar com as telas e tintas à vontade, fascina-me.

O futebol não é tema para as suas pinturas?

Só quando era miúdo. Agora não tenho um tema preferido.

Quando está no ativo como treinador, arranja tempo para pintar?

É mais difícil. O futebol ocupa-me de domingo a domingo e também quero estar com a família, ler, ouvir música e ir ao cinema. Acho cada vez mais importante ter a capacidade de abarcar várias áreas, há inclusive universidades de medicina nos EUA, em que os alunos têm aulas de música e desenho. É importante o cérebro ganhar essa plasticidade. Tento ter essa capacidade de me abstrair, para depois também poder pensar melhor o treino de futebol.

"No segundo ciclo, umas professoras aconselharam-me a seguir belas-artes"

Sente que os seus colegas de profissão têm a mesma preocupação?

Tenho para mim que quem só percebe de futebol, nem de futebol percebe. É importante ter experiências noutras áreas, enriquece-nos e permite-nos ter também uma visão mais abrangente do futebol. O Mourinho ou o Fernando Santos, por exemplo, são pessoas cultas. O futebol exige cada vez mais que o treinador não seja um mero ex-jogador de futebol, que só percebe do cheiro do balneário.

Mas acha que a mentalidade está a mudar?

Sem dúvida. Hoje não se pode dizer, como há 30 anos, que os jogadores são burros ou incultos. Há uns tempos li que o Juan Mata tem dois cursos superiores. E curiosamente, fui há pouco tempo a Manchester ver o United-City e, no final do jogo, estive a observar o Juan Mata à saída dos balneários. Foi sempre extremamente simpático e educado, num jogo em que não saiu do banco de suplentes. Aliás, já tinha sido preterido pelo Mourinho no Chelsea.

"Tenho sempre propostas para ir para fora, neste momento tenho duas de África"

Não pensa em voltar a treinar?

Claro que penso. Gosto dos comentários, mas a minha vida é ser treinador. Simplesmente, o que tem aparecido não me tem agradado. No nosso país há muita concorrência e os critérios de seleção nem sempre são os melhores. Vemos treinadores na primeira liga sem qualquer background.

Quais as exigências mínimas para aceitar um convite?

Em Portugal, um clube de I Liga ou de II com pretensões a subir e alicerces fortes. Tenho sempre propostas para ir para fora, neste momento tenho duas de África. Mas, nesta altura, dou-me ao direito de não aceitar qualquer coisa. Veem-se muitos treinadores na I Liga, que nem sequer metade do meu percurso têm.

Tem-se preocupado com o chamado "networking"?

Sim. O facto de aparecer na televisão já me dá alguma visibilidade e tenho ainda uma pessoa a ajudar-me na gestão da carreira. É verdade que tenho uma forma de estar "low profile" e, neste meio, isso não é muito bom. Manter ligações com grandes empresários ou clubes dá a alguns logo a oportunidade de irem treinar para a primeira liga. Por isso dou valor a alguns treinadores, como o Rui [Vitória] ou o Jorge [Jesus], que tiveram um trajeto parecido com o meu e subiram a pulso.(in O JOGO.pt)

 

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