Tive esta semana uma despedida especial. Na quinta-feira terá saído de Moçambique o Padre Vicente Berenguer. Deixou esta mensagem no meu correio eletrónico:
“Amigo, Pedro! Depois de 12 anos em Ressano Garcia tenho que dar lugar a outros para que novas forças, novas ideias, novas vontades possam desenvolver sementes lançadas e lançar novas culturas!
Vou a Espanha de "férias"…descansar, refletir…os meus 79 anos de idade, os meus 49 anos de Moçambique e em breve os meus 50 anos de Padre…merecem uma reflexão prolongada…
Obrigado pelo que de ti aprendi (Boroma, Buracos Macuas, Dizer por Dizer…)e de modo especial o ter-me chamado a Chibututuíne para relembrar-me a "produção escolar", desde Iapala a Maputo.
Obrigado, Pedro!
Vou preocupado pela ausência da PAZ em Moçambique…gostaria um dia de regressar e poder atravessar todo o país com inteira tranquilidade…é o meu desejo…é o que peço ao Senhor diariamente. E aos homens de boa vontade…
Um abraço”.
Não devia ser ele a dizer isso tudo. Devia ser eu a dizer o que vou dizer. Tinha 18 anos de idade quando o Padre Berenguer, em Maio de 1980 chegou no Centro Educacional de Iapala, onde eu era aluno da Sexta Classe.
Vinha do Ministério da Educação e Cultura, onde desempenha funções no departamento de Produção Escolar. Iapala era um “ás” em matéria de produção e até autossuficiente em certos produtos, ficando por receber do Programa Mundial de Alimentação (PMA) o leite e a sardinha, normalmente, a Norway.
Naquela tarde duma quarta-feira, o Padre passou pelos dormitórios para aferir o grau de participação dos alunos na produção escolar. Todos estavam fechados porque os seus ocupantes haviam ido às vastas e diferentes áreas de produção das machambas que circundavam nos sopés das montanhas que escondem a escola.
Todavia, colidiu com uma anormalidade no dormitório “ 3 de Fevereiro”, um antigo secador de tabaco. Estavam lá três alunos, Quitério Luís Moquino, Eugénio Impite e eu. Era motivo de ir desmentir a direcção da escola de que todos estivessem envolvidos na produção.
Quando quis saber da razão por que os três não tinham ido às machambas, coube à mim responder: aqui também estamos a produzir, estamos a preparar as lições para aulas de alfabetização e educação de adultos, de que somos responsáveis. Alfabetizar é produzir e, pessoalmente tinha outra tarefa: estava a arrumar os materiais noticiosos que seriam lidos no habitual encontro das 19 horas para o resto da escola. Era responsável da informação da escola. Também era produzir.
No ano seguinte, voltou a Iapala e deram-lhe a informação de que me encontrava em Maputo para formação. Procurou-me e me convidou para almoçar no seu apartamento, num domingo de Março de 1981, no prédio Marina, na avenida Julius Nyerere. Era a primeira vez que ia à mesa constituída de brancos.
Nunca mais perdeu as minhas peugadas, desde Chibututuíne, Boroma, Nampula, Pemba, Maputo…e foi um convidado especial no lançamento da II edição do Boroma, em Março de 2009, pelas razões encimadas, tal como fui sabendo da sua contribuição, sem medida, na província de Tete, sobretudo na Escola Industrial e Comercial “ Mártires de Wiriamu” e outras frentes.
Estava em Ressano Garcia, aqui perto, não consegui visitá-lo em nenhuma vez, embora nos correspondêssemos. Que mal-agradecido! E já foi, o Padre Vicente Berenguer…
Sem mesmo fazer a nossa entrevista sobre o massacre de Wiriamu que tinha prometido!
Pedro Nacuo
nacuo49nacuo@gmail.com