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Circuncisão? Só em unidades sanitárias

Por admin

Solicitar a mão de profissionais ambulantes, que amiúde se apresentam nos bairros como especialistas em cirurgias de retirada do prepúcio, acarreta riscos inimagináveis: “A circuncisão pode até não ser feita, apesar da intervenção cirúrgica…”.

Este é o alerta deixado pelas autoridades de saúde, que apelam à não adesão a estes serviços fora das unidades sanitárias, pois custam caro ao bolso e, acima de tudo, à saúde.

Com efeito, várias campanhas têm sido lançadas e intensificadas desde o ano de 2009, mobilizando a população masculina a dirigir-se aos locais oficiais para a realização da circuncisão.

Ainda assim, persistem práticas seculares envolvendo os que se autoproclamam técnicos de saúde, que atraem até si pacientes ávidos de se tornar “novos homens”. É que no passado era comum cruzar, pelas zonas residenciais, com senhores de pasta em punho, à procura de pacientes interessados nos seus serviços,conforme narra Nehemias Nhangumbe, de 87 anos, natural de Inharrime e residente no bairro da Matola.

Eu próprio fazia esse trabalho, mas baseado na minha formação. Sou enfermeiro com diploma tirado em 1959, e durante o treinamento ensinaram-me a fazer circuncisão, mas não estávamos autorizados a trabalhar fora do hospital”, confessa.

Esta actividade paralela rendia-lhe “alguns escudos” (moeda portuguesa) e, garante-nos, era feita com muito cuidado: “depois da cirurgia fazia um penso asséptico, ou seja limpo, para não dar espaço às infecções; lavava e controlava a ferida um dia/sim, o outro/não, até sarar completamente”, garante.

 Mas se pela mão deste enfermeiro aposentado o trabalho sempre decorreu a contento, a mesma sorte não encontram outros pacientes ao confiarem os seus tesouros aos‘técnicos ambulantes’. Tal é o caso de um menor de 2 anos, cuja identidade não será revelada, que reside com os seus pais no posto administrativo da Matola-Rio, distrito de Boane, Província de Maputo.

Há sensivelmente dois meses caiu em mãos erradas, por culpa da sua própria mãe, conforme conta um membro da família da vítima, I. Mário, ao domingo.

A minha irmã entregou os filhos, um de 5 anos e outro de 2, aos cuidados de um indivíduo que, de vez em quando, anda pela zona a fazer esse trabalho”. A mão do referido técnico errou e criou uma ferida que, até ao momento, não cicatriza, passadas sete semanas.

Facto preocupante é que, de acordo com esclarecimentos de técnicos de saúde, o tempo normal para a cura da ferida é de uma a duas semanas em menores de idade, e de duas a três semanas em adultos.

Embaraçado com o problema, o indivíduo vem receitando, “desesperadamente, comprimidos e pomadas que em nada resultam”.

A mãe do menor passa por momentos de tormento, afinal a criança queixa-se de dores no seu órgão sexual. Mesmo assim, “ela insiste em confiar no enfermeiro (como é conhecido no local)”, sobretudo por recear  que, ao se dirigir a uma unidade sanitária para apresentar e tratar do problema do menino, poderá expor aquele indivíduo às autoridades policiais.“Acredita que possam prendê-lo por causa dos estragos que fez, então prefere resistir até que a saúde do meu sobrinho melhore”.

Nenhum singular está credenciado

– Jotamo Comé, Director Nacional do Programa de Circuncisão

Todo acto médico feito fora do hospital acarreta riscos, portanto não é recomendável…”, adverte Jotamo Comé, a propósito das cirurgias de retirada do prepúcio realizadas longe do controlo das autoridades de saúde.

Deste modo, Comé afasta qualquer possibilidade de existência de pessoas credenciadas, à margem do sector, para a realização destas operações, até porque “os pacientes ficam expostos aos falsos técnicos e às condições inadequadas para serviços de saúde”.

O mais agravante, alerta, “a circuncisão pode até não ser feita ou pode-se retirar muita pele ou amputar parcial ou totalmente a glande, cabecinha do pénis, como se diz vulgarmente”, provocando doenças ou defeitos nos pacientes. E tem mais: “em alguns casos, pode-se cortar ou abrir acidentalmente a uretra, o que provoca uma lesão que se designa por fístula uretral. Como consequência, “ao invés de a urina sair da ponta, passa a sair de lado”, adverte.

Destaque-se que, em todo o país, existem 60 unidades fixas que realizam cirurgias desta natureza, acopladas aos hospitais. O trabalho de mobilização para a adesão a estes serviços foi intensificado no ano de 2009, em escolas e comunidades, e conta com o apoio de professores, líderes religiosos e até governantes, conforme refere Jotamo Comé.

Eliminar as barreiras no organismo que dificultam a higiene e constituem um meio de contaminação de doenças é a justificação fundamental para a realização da circuncisão, daí que se apela: “Faça… e torna-te um homem novo/ Faça logo, é seguro e gratuito”.

Conforme aclarou Jotamo Comé, esta cirurgia pode ser feita em qualquer idade, contudo, as atenções estão viradas, no momento, para indivíduos acima dos dez anos de idade, “considerado o grupo de maior risco, propenso a actividade sexual”.

Texto de Carol Banze
carolbanze@snoticias.co.mz

Fotos de Jerónimo Muianga e Carlos Uqueio

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