O Governo tomou recentemente a decisão de estimular o uso da via marítima para o transporte, sobretudo de mercadorias, no quadro de uma política mais profunda que visa explorar o mar como via preferencial de transporte para reduzir os preços dos produtos, acidentes rodoviários, consumo de combustíveis, desgaste das estradas e de poluição ambiental.
Com cerca de dois mil quilómetros de linha de costa e com uma localização reconhecidamente estratégica, Moçambique deveria ser um centro logístico regional e beneficiar de múltiplas vantagens que a cabotagem oferece. Entretanto, o país não possui um único navio para o transporte de pessoas e bens, e todas as suas necessidades neste domínio estão dependentes de fretes que são feitos no estrangeiro.
Este quadro contrasta com a realidade que o país viveu na década de 80, quando existia uma empresa estatal, denominada NAVIQUE, que detinha o monopólio do transporte marítimo, possuía uma frota de 21 navios e transportava até 220 mil toneladas por ano.
Porém, o reinício da circulação rodoviária, que ocorreu depois da Assinatura dos Acordos de Paz, em 1992, coincidiu com a diminuição de carga nos portos, o que foi agravado pela redução do número de navios por abates e sem necessária reposição.
Perante esta realidade, há anos que o Governo ensaia planos, medidas e projectos que visam a revitalização da navegação entre os portos nacionais e, a título de exemplo, em Junho de 2009 aprovou a Estratégia para o Desenvolvimento Integrado do Sistema de Transportes.
Neste instrumento, é salientado que a cabotagem marítima é um dos modos de transporte mais viáveis para cargas a longas distâncias, ao contrário do transporte rodoviário que apresenta uma lista quase interminável de desvantagens.
Para sustentar a sua posição, o ministro dos Transportes e Comunicações (MTC), Carlos Mesquita, ajuntou dados que indicam que, até ao final do ano passado, a frota mundial era de cerca de 105 mil navios correspondente a 1,5 mil milhões de toneladas de carga, dos quais cerca de 37 por cento é de navios petroleiros, 35 por cento de navios graneleiros, 12 por cento de navios de mercadoria contentorizada, cerca de 10 por centode navios de carga geral e seis por centode outros tipos de navios.
Porque o país possui uma posição estratégica face aos países do “hinterland”, o “governo” pretende que o sector privado nacional e estrangeiro faça um maior aproveitamento da costa, porque mais de 90 por cento do comércio mundial são transportados por via marítima e este sector contribui com mais de 380 mil milhões de dólares em fretes por ano, equivalente a 5 por cento do total do valor do comércio mundial.
Assim sendo, o MTC pretende que sejam exploradas todas as vantagens comparativas da sua localização e, dessa forma, contribuir para o alcance de duas das cinco prioridades plasmadas no Programa Quinquenal do Governo (PQG), nomeadamente a promoção de emprego, melhoria da produtividade e competitividade e desenvolvimento de infra-estruturas económicas e sociais.
BARREIRAS REMOVIDAS
No decurso das análises feitas nos últimos anos, constatou-se que a via marítima incorpora uma extensa lista de benefícios que incluem o custo unitário de transporte, capacidade de cobertura a grandes consumidores, índice de consumo de combustível, de poluição ambiental, segurança de carga, potencial de acidentes nas viagens, congestionamento de tráfego, custo de manutenção de vias, nível de avarias nas viagens e tempo de vida útil do equipamento.
Mesmo com o reconhecimento da existência dessas vantagens, persistiam vários constrangimentos que inibiam o ressurgimento deste sector, com ênfase para “a burocracia no processo de transbordo de carga nos portos, elevada taxa de juros cobrados pela banca comercial, incidência de 10 por cento da taxa liberatória sobre os navios fretados com bandeira estrangeira”, indicou Carlos Mesquita.
A acrescer a estas barreiras prevalecia a falta de navios próprios que resultava no frete dos mesmos fora do país e consequente saída de divisas do país, falaram do uso intensivo do transporte rodoviário que tem implicações no dispêndio de avultadas somas do erário público na manutenção de estradas e aumentode níveis de acidentes de viação.
Foi igualmente invocado que quando há alguma obstrução na Estrada Nacional Número Um (EN-1), por cheias ou factores humanos, a mobilidade de pessoas e bens torna-se condicionada, o país também perde com o elevado consumo de combustíveis para camiões de carga, com repercussãono custo dos produtos ao consumidor final, o que é agravado por uma elevada poluição ambiental.
Assim, o Governo implementou um conjunto de acções de curto prazo para a revitalização da cabotagem, os quais estão orientados para conferir prioridade à atracação de navios nos portos nacionais e redução de tarifas portuárias nos portos nacionais.
Também introduziu medidas que visam reduzir as taxas cobradas pelo Instituto Nacional de Marinha (INAMAR) e pelo Instituto Nacional de Hidrografia e Navegação (INAHINA), o Registo Especial para navios estrangeiros, simplificação de procedimentos por parte das Alfândegas e iniciou o processo de reestruturação da empresa Transmarítima.
MEDIDAS IDENTIFICADAS
Dados colhidos junto do MTC indicam que o Governo estabeleceu que é prioritária a atracação de navios nos portos nacionais, pelo que foram assinados memorandos de entendimento com as concessionárias portuárias que aceitaram reduzir as tarifas, nomeadamente Maputo Port Develompment Corridor (MPDC) em 50 por cento, Corredor de Desenvolvimento de Nacala (CDN) 50 por cento, CORNELDER aceitou reduzir em 60 por cento para o porto da Beira.
A mesma CORNELDER admitiu uma redução de tarifas em 50 por cento para o porto de Quelimane e a empresa Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM) procedeu de igual modo e sem contrapartidas para o Estado.
Também foram assinados diplomas ministeriais, nos quais o INAMAR reduz em 40 por cento as taxas de prestação de serviço e o INAHINA em mais de 50 da Taxa Anual de Navegação (TANAV). Foram ainda tomadas medidas para a simplificação de procedimentos sob alçada das Alfândegas, realizados três encontros de harmonização com as Alfândegas.
No quadro da reestruturação da Transmarítima foi indicado um novo Conselho de Administração e enviada a proposta para a tutela que é o MTC e para o Instituto de Gestão de Participações do Estado (IGEPE), a que se adicionou a proposta de reestruturação financeira da empresa e a estratégia de operação do transporte marítimo de cabotagem e de longo curso.
Há dias, o Conselho de Ministros aprovou o decreto que viabiliza o Registo Especial de Navios Estrangeiros para alvorarem a Bandeira Nacional, sob determinadas condições como forma de fortalecimento das empresas moçambicanas de navegação.
Outras medidas passam pela melhoria dos canais de acesso e infra-estruturas portuárias em portos terciários, aprovação de incentivos especiais, criação do órgão regulador dos portos nacionais, desenvolvimento do capital humano no subsector da marinha mercante e fortalecimento com meios humanos e materiais à Escola Superior de Ciências Náuticas.
Também está em curso um plano para a comparticipação das empresas de navegação marítima no Fundo de Transportes e Comunicações (FTC) destinado à formação náutica, obrigatoriedade das empresas de navegação marítima registadas em Moçambique de embarcarcadetes das instituições de ensino náutico para estágio, adequação da legislação laboral nacional marítima às convenções internacionais.
“Para a materialização de algumas destas acções está em curso a elaboração do plano-director de cooperação no subsector da marinha mercante entre o MTC e a Embaixada dos Países Baixos”, revelou Carlos Mesquita.
Texto de Jorge Rungo
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