Cai hoje o pano sobre o Encontro e Laboratório de Comunicação e Educação para o Desenvolvimento –ENLACE-D – evento sociocultural e económico que vinha decorrendo, desde a ultima quarta-feira no Centro de Teatro do Oprimido, no bairro de Hulene e que juntou, num só espaço, artistas, camponeses e activistas de várias áreas de desenvolvimento.
O Enlace-D Moçambique 2016 tem a pretensão de se constituir como um espaço onde o acesso à informação e ao conhecimento através das artes cénicas, vídeo, livro bem como através de colóquios e oficinas de conhecimento tem um lugar privilegiado. O encontro é um espaço de valorização de formas comunitárias de intervenção social e exposição de grupos e activistas sociais baseadas nas zonas rurais.
O acesso à informação e ao conhecimento, constitui nos dias de hoje, uma premissa básica para a realização efectiva de acções conscientes e concertadas por parte dos actores sociais, nos processos de desenvolvimento a todos os níveis. Aliando este pressuposto a processos dinâmicos e funcionais de partilha e preservação da memória sobre a acção dos indivíduos e sobre as actividades desenvolvidas e implementadas com sucesso pelas instituições, pode se conseguir algo de essencial: a retenção, registo e sistematização de experiências e boas práticas que muitos buscam para melhor agirem na solução dos seus problemas e na remoção dos desafios que as comunidades enfrentam.
O crescimento das organizações sociais é sempre acompanhado, não só de dificuldades e desafios, mas também de acumulação de informações, conhecimentos, e experiências, cuja divulgação e partilha interessa, para o desenvolvimento de estratégias acertadas, estabelecimento de parcerias, intervenções com resultados bem como o favorecimento à investigação e a sociedade como um todo.
O Centro de Teatro do Oprimido – Moçambique, ciente destes desafios, organizou o II Enlace-D e, juntou artistas (actores, músicos, artesãos, produtores, entre outros) a camponeses de Alto-Changane, Marracuene, Machaila, Jangamo, Namaacha para 5 dias de intensas actividades criativas, exposições-venda de produtos agrícolas, espectáculos teatrais e musicais, entre muitas outras actividades.
A ARTE DEVE SERVIR
A COMUNIDADE
Feira de variedades, colóquios, oficinas de teatro, vídeo-forum e lançamento de um livro, corporizaram o Enlace D 2016, cuja cerimónia de abertura foi dirigida pelo Ministro da Cultura e Turismo, Silva Dunduro, o qual, na sua intervenção, ressalvou o papel que a cultura e as artes têm para o desenvolvimento das nações.
“As artes devem servir as comunidades. A cultura é um dos fundamentos básicos para o desenvolvimento socioeconómico do nosso país. As técnicas do Teatro do Oprimido que o CTO usa ajudam as nossas comunidades a buscarem soluções locais para problemas específicos”, disse Silva Dunduro.
Dunduro destacou ainda que o Enlace-D era uma ocasião soberana para o fortalecimento das plataformas de acesso e partilha de conhecimentos, orientações para o suporte do desenvolvimento comunitário e organizacional a vários níveis, acrescentando que “à semelhança do próximo Festival da Cultura a ter lugar na província de Sofala, exorto a todos a participarem activamente neste encontro”.
E os artistas e camponeses não se fizeram de rogados. Roberto Chitsondzo, o grupo de teatro Mahamba, o agrupamento Central Line, Makwaela Acordo de Paz, entre outros, abrilhantaram a cerimónia de abertura, marcando o inicio de uma série de actividades que tem o seu ocaso precisamente hoje.
E o que aconteceu durante o Enlace-D?
Muita coisa. Muita animação. Muita interacção. Muita música. Muito teatro. Os diversos participantes tiveram momentos de verdadeira festa. Uma das notas de destaque foi para a Mostra pública de ferramentas relevantes de educação e comunicação para o desenvolvimento desenvolvidas ou utilizadas com sucesso por organizações sociais baseadas em Moçambique ou que actuam nas áreas de desenvolvimento junto as comunidades locais com enfoque para a transformação social e desenvolvimento.
As oficinas de conhecimento para apresentação e debate de temas seleccionados, com interesse para a transformação social e desenvolvimento, tais como Processamento para a conservação de hortícolas por secagem, Agroecologia, Desafios do acesso a terra por mulheres, Violência baseada no género, Desafio da mulher nas artes, foram alguns dos temas que prenderam as atenções dos participantes.
Projecção de vídeo-documentários que contribuam para despertar a consciência e interesse nas áreas afins aos processos de transformação social e desenvolvimento; A exposição e venda de diferentes produtos e obras de artesanato com especial destaque as resultantes da reciclagem ou produzidas sem agressão ao meio-ambiente, aplicando-se os princípios de Economia Solidária, constituíram-se como momentos de grande interesse.
Outro momento de exaltação foi o Palco e Microfone aberto para espectáculos de Teatro, Música, Dança, Poesia, Humor de entre outras artes cénicas, desde que os enredos e conteúdos fossem propícios para a partilha de conhecimentos e desenvolvimento.
Ai, os grupos teatrais dos camponeses assumiram a dianteira e animaram os espectadores com as suas peças e os debates (teatro fórum) dirigidos pelas “mamanas” (matronas). Os temas, na sua generalidade, abordavam temas como agricultura (como produzir mais), prevenção de queimadas descontroladas, relações inter-pessoais, entre muitos outros, tudo com alto sentido de humor.
O lançamento do livro Teatro do Oprimido: Raízes e Asas – Uma Teoria da Práxis” da Bárbara Santos, foi outro momento de suma importância. O livro foi apresentado pelo jornalista Belmiro Adamugy enquanto os brasileiros Alessandro Conceição e Cláudia Simone fizeram a vez da autora.
Ainda durante estes dias foram projectados diversos filmes, com destaque para A Herança da Viúva e A Guerra da Água de Licinio Azevedo; Campo Meu Futuro de Alto-Changane em Cena.
Diversas organizações e parceiros do CTO, a exemplo de UNAC, ADCR, Action Aid, N´weti, Fundação Elizabet Glaser, participaram do Enlace-d 2016.
15 ANOS “DO OPRIMIDO”
O Enlace d 2016 coincidiu com a celebração dos 15 anos da introdução do Teatro do Oprimido em Moçambique. De facto, foi em 2001 que Alvim Cossa participou numa oficina de formação em técnicas de teatro do oprimido no Rio de Janeiro, Brasil e, no dia 16 de Julho desse mesmo ano, foi formado oficialmente o Grupo de Teatro do Oprimido – Maputo.
Sobre o facto, Alvim Cossa coordenador geral do CTO e do Enlace D, disse ao domingo que “Foram 15 anos de muitos desafios mas que também serviram para produzir grandes frutos. Conseguimos expandir o teatro do oprimido para todo o território nacional. Conseguimos torna-lo efectivamente uma ferramenta de comunicação, partilha e de afirmação do Eu de cada individuo, desde camponeses, professores, policias, operários, crianças que hoje usam o teatro de oprimido como forma de expressarem as suas necessidades e partilharem propostas de soluções”.
Celebrou o facto de terem também conseguido criar um espaço próprio para as suas actividades e de outros actores das artes e cultura e “é neste mesmo espaço onde agora fizemos o Encontro e Laboratório de Acção em Comunicação e Educação para o Desenvolvimento. É um espaço que cresce a cada dia”.
Sobre o Enlace-D, Cossa sumarizou assim: “o evento foi muito bom, trouxe muita aprendizagem nova. Possibilitou aos camponeses espaço para venderem os seus produtos. Conheceram novos lugares, conviveram com artistas e no fim do dia produziu os resultados esperados”.
Acrescentou que o pessoal do teatro aprendeu muitas coisas em termos de conteúdos para novas produções.
Belmiro Adamugy
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