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As jogadas do primo Armindo

Por admin

O primo Armindo foi um génio que não chegou a ir à escola e quando quis sair de Morrumbala, para experimentar outros ares, foi parar na cidade da Beira donde partiu para África do Sul à procura de emprego nas minas.

Não tendo conseguido integração efectiva em “John”, regressou directinho à Morrumbala.

Trazia somente passaporte, um par de calças, uma camisa e um par de tacau (tipo de sapato masculino de salto alto, então muito apreciado em Morrumbala). Tudo colado ao corpo. Disse ter deixado sua bagagem na Beira onde, aliás, nunca mais pisou.

Dizia-se dele que quando criança jogava bem futebol, lá na aldeia,  no mato. Gostava de driblar os adversários, por vezes os próprios colegas de equipa. Pela fama que adquirira nas suas bandas e arredores, o primo Armindo envaideceu-se. Começou a beber e a fumar suruma. Era o preço da fama mal digerida. Passou a perder noites em lugares onde se tocava varimba, dança muito envolvente parecida com timbila.

Nessas noites de dança, bebida e cigarro o primo Armindo também se viciou em sexo. Não aguentava passar uma noite sem praticar relações sexuais; chegava a agredir para atingir seus intentos. Por causa disso, o primo Armindo arranjava muitos sarilhos. Pior: roubava para sustentar os vícios que se acumulavam no seu ser.

Lembro-me de uma vez, quando ouvíamos pela rádio falar de Matateu, Eusébio, Coluna e Pelé.

 Inspirado, desatou a fazer suas demonstrações de mestria naquilo que denominou de “minhas jogadas”. Segurou na bola feita de folhas de bananeiras e fez das suas. Entre toques, simulações de arranque e bola ao peito, num movimento próprio de um “louco” na área, mostrou os seus dotes. Todo mundo parou. Ficou boquiaberto. As mulheres entreolharam-se. Era o recordar de um passado, que o teria levado ao estrelato no futebol, se não fosse a sacanice dos vícios que escolheu.

 O primo Armindo ganhou pseudónimo Maduinha (o empurrão) que o tornou muito famoso na aldeia e em todo o regulado de Denguma, na comunidade de Thunduzi.

Astuto, fez “jogadas” para não ir à tropa. Tudo em vão.  Foi alistado, e já na tropa, fez uma mirabolante jogada:  engravidou a mulher do comandante, facto que lhe custou um tiro por encomenda do tal oficial. Primo Armindo perdeu a vida em plena guerra.

Até hoje a população de Thunduzi recorda-se das jogadas do primo Armindo. Contam-se diversas como a de roubar porco para comer com uma determinada família e roubar desta para comer com a primeira.

O primo Armindo era um jogador da vida, que sabia alegrar a uns e entristecer outros. Vivia vigiado porque era temido: roubava, batia em nádegas de mulheres… e desaparecia sem deixar rastos. Tinha a capacidade de, no mesmo dia, ser hóspede em muitas casas e em muitas aldeias.

Lembro-me dele querendo arrancar de nós, então miúdos, uma panela que continha uma saborosa mão de macaco, justificando-se que não era comida para crianças…. Tudo terminou da pior forma possível: Nessa disputa, a panela da vovó Tchanazi ficou achatada e a saborosa mão do macaco foi parar na boca do Robson, o cão de guarda da velha Tchanazi!

Manuel Meque

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