Texto de Manuel Meque
A ansiedade de sair do país para se treinar no estrangeiro terá contribuído para que a pugilista Maria Manuela perdesse a bolsa da Solidariedade Olímpica a que tinha sido atribuída pelo Comité Olímpico de Moçambique (COM), cujo acordo foi assinado a 16 de Setembro de 2014. Para o seu lugar foi indicado o pugilista Juliano Máquina, que começa a ficar transtornado por ainda não saber quando segue.
Para a pugilista terá havido uma “mão maldosa” que tudo terá feito para que não se beneficiasse da bolsa, depois de tanto seguir o expediente após ter rubricado acordo com o COM.
Ela nega que tenha desistido da bolsa e acredita na possibilidade de alguém ter conduzido propositadamente mal o processo que a permitiria ir preparar-se fora do país na busca de um lugar nos Jogos Olímpicos de 2016, na cidade de Rio de Janeiro, Brasil.
A falta de comunicação adequada com o COM levou com que a pugilista se enchesse de ansiedade, agravada pela informação avulsa de que outros bolseiros já estavam nos países de gozo das respectivas bolsas.
Maria Manuela começou a desesperar da bolsa quando recebeu a papelada de recusa de visto para Irlanda, país onde ia gozar a referida bolsa. Diz ela que os irlandeses não tinham garantia de que a sua família e o seu marido suportariam financeiramente a sua estada naquele país.
Foi quando se interrogou: como minha família e esse marido que não tenho, se a bolsa me foi atribuída no âmbito da Solidariedade Olímpica? Foi ter com o presidente do COM, Marcelino Macome, que, diplomaticamente, diz ela, garantiu que “ não há problema” e que o assunto seria resolvido e ela seguiria para Cazaquistão e não para Irlanda, onde a atleta estivera de preparação para os Jogos da Commonwealth.
Esfregou as mãos de alegria, mas no dia do novo encontro com Marcelino Macome, foi comunicada que o presidente havia viajado e que só voltaria três dias depois. Começa o desespero da pugilista.
Nos dias seguintes no COM era lhe sempre comunicada “volta na segunda-feira”, mas ela preferia ir todos os dias. Achava-se atrasada na preparação que devia ter para lutar por um lugar nos Jogos Olímpicos do Rio. Queria seguir de imediato para o estrangeiro. Enganava-se. Não era isso que gente do COM pensava.
Cinco meses depois de espera de uma bolsa no estrangeiro, Manuela decidiu manter-se na África do Sul, a titulo individual, a treinar-se e a estudar. Trocou Maputo por Joanesburgo. De lá telefonicamente procurava saber do processo da sua bolsa, mas nem sempre as suas chamadas eram atendidas.
O tempo foi passando, a ansiedade de gozar bolsa no estrangeiro foi morrendo e foi tomada pelo desespero e frustração. Quando se solicitou de urgência a sua caderneta e currículo do seu treinador para o preenchimento da documentação tendo em vista a viagem ao Cazaquistão, a pugilista respondeu que não podia abandonar treinos e aulas na África do sul, para além de que o tempo de correr para Maputo era escasso.
Pediu ao seu tio e ao presidente da FMboxe para que se informassem das intenções do COM, deixando claro que não autorizaria a cedência da sua caderneta que se encontrava em Maputo e que não enviaria nenhum currículo do seu treinador, fosse ele moçambicano ou sul-africano.
A pugilista Manuela terá pensado que toda a gente do COM transpiraria para que ela fosse gozar bolsa no estrangeiro. Esquecera que neste nosso desporto é cada um por si, Deus por todos. Que a sua bolsa não era assunto de Estado que obrigasse ao COM trabalhar para a sua concretização.
E porque havia (e ainda há) bicha de outros pugilistas à espera de oportunidade de gozar da bolsa olímpica, achou-se por bem chamar para o lugar de Maria Manuela outra pessoa. E, também, merecidamente essa bolsa foi atribuída ao pugilista Juliano Máquina, participante dos Jogos Olímpicos de Londres 2012.
Ela foi substituída
por Juliano Máquina
– Esclarece Benjamim Uamusse, presidente da FMBoxe
O presidente da Federação Moçambicana de Boxe (FMBoxe), Benjamim Uamusse (Big Ben), diz que Maria Manuela já perdeu a bolsa a que tinha sido atribuída por mérito próprio, mas que não soube a agarrar.
“Por indicação do Comité Olímpico de Moçambique (COM) escolhemos a pugilista Maria Manuela para bolsa olímpica. Ela ganhou a bolsa por mérito próprio. E por documento autorizamos o COM a se responsabilizar pela bolsa”, começa por explicar Big Ben.
“Mais tarde tomamos conhecimento que a Federação Internacional de Boxe Amador não reconhece Irlanda como país com centro de alto rendimento para preparação de atletas amadores olímpicos. Nesse aspecto foi-nos apresentada a proposta de a pugilista seguir para os Estados Unidos de América ou para o Cazaquistão, aqui onde para além de treinos os bolseiros participam em torneios competitivos” acrescenta o presidente da FMBoxe. Até essa altura tudo parecia bem encaminhado.
“Surpreendentemente, a atleta desapareceu de Maputo. Ficamos a saber que estava na África do Sul. Mais tarde fomos solicitados pelo COM para a possibilidade de substituição de Maria Manuela por uma outra pessoa para que a bolsa não fosse perdida. Propusemos Juliano Maquina, mercê do seu ranking. Neste momento o que podemos dizer, entanto federação, é de que a bolsa inicialmente destinada a Maria Manuela passou para Juliano Máquina. Podia ter ficado com uma outra mulher que tivesse performance equivalente”, concluiu Big Ben, que no dia do encontro com a nossa reportagem não sabia que Maria Manuela já se encontrava no país a treinar-se na Academia Lucas Sinóia.
“Estou a ouvir consigo que ela está no país para desmentir que não desistiu da bolsa. Seria bom para ela que primeiro viesse saber junto da federação saber o que se passou na sua ausência”, assinalou o dirigente máximo do boxe moçambicano.
Não é verdade que
desisti da bolsa olímpica
– Maria Manuela apresentando o “filme” de que é actriz-vítima
A pugilista Maria Manuela se apresenta no “ringue” para defrontar o Comité Olímpico de Moçambique (COM) e Federação Moçambicana de Boxe (FMBoxe). E desfere muros para Marcelino Macome, presidente do COM, e para Benjamim Uamusse (Big-Ben), presidente da FMBoxe. No fim, caberá aos nossos leitores, no lugar de juízes, dizer quem venceu o combate, se eles, os dirigentes, ou ela, a atleta.
“Eu não seria capaz de abandonar uma bolsa que tanto persegui. Fui tantas vezes ao COM para saber do atraso. Depois o senhor Benedito enviou-me a documentação de visto via internet. Fiz o devido encaminhamento. Vinte dias depois recebi a informação de recusa de visto por parte da Irlanda. Fiquei nervosa, pois já tinha perdido muito tempo em vão”, Maria Manuela, iniciando o desmentido de que abandonou a bolsa da Solidariedade Olímpica.
“Da papelada de recusa de visto se dizia que eu, minha família e o meu marido, não provamos ter capacidade financeira de me manter na Irlanda. O outro erro do COM foi de ter requerido visto para dois anos quando o normal se faz de seis em seis meses. No próprio COM fui informada de que na verdade houve erros na solicitação do meu visto para Irlanda”, aponta.
“Falei com o presidente Marcelino Macome que me prometeu que o problema seria urgentemente resolvido. Perguntei-lhe se eu devia ficar à espera ou podia seguir para a África do Sul, onde tenho estado a estudar e treinar. Foi quando o presidente Macome me perguntou quanto eu gastava de treinos na África do Sul. Orientou-me a elaborar um orçamento do meu treinamento para entregar no COM. A minha resposta foi de que eu na África do Sul não pago nada para treinar. Disse-lhe que não faria nenhum orçamento, até porque esse seria trabalho da federação. Fiquei na sala de visitas do COM à espera que o presidente me dissesse se podia seguir para a África do Sul ou não. Disse-me que o assunto seria tratado de imediato e que até segunda-feira (estávamos a falar na sexta-feira) teria a resposta e, provavelmente, tudo tratado para seguir a Irlanda.”
Afinal, o “filme” ainda estava no começo. “Quando na segunda-feira voltei ao COM fui informado que o presidente Macome tinha viajado e que só voltaria três dias depois. Fiquei uma semana de ida e volta ao COM. Quando percebi que nada estava a ser feito, procurei pelo presidente da Federação, Benjamim Uamusse (BIG-BEN)”.
BIPS DO COM E
COMEÇO DA FRUSTRAÇÃO
O personagem Big-Ben anima o “filme” e complica mais a situação da atleta Manuela.
“Contei tudo ao presidente da federação. Incrivelmente, ele também não tinha nada a dizer, alegadamente porque não estava a par do assunto. Na verdade, o assunto da minha bolsa é da exclusiva responsabilidade do COM, conforme os acordos assinados. A única coisa que Big Ben me disse foi de que eu devia esperar, pois ele iria ao COM inteirar-se do assunto. Dai em diante passou a não atender as minhas chamadas telefónicas”, conta Maria Manuela.
Aos poucos Maria Manuela começou a perceber que perderia a bolsa.
“Com o passar do tempo comecei a ficar frustrada. Passei a sentir que tinha perdido algo importante para a minha carreira desportiva por falta de ajuda da federação. Continuei a treinar na Academia Lucas Sinóia, por vezes no Ferroviário com o treinador cubano, enquanto ia tentando entrar em contacto com o presidente da federação, que continuava a não me atender. Depois de muita insistência atendeu-me dizendo que não tinha nenhuma resposta do COM.”
De novo no COM, Maria Manuela recebe uma carta de confirmação de provável ida a Cazaquistão, depois de descartada a viagem para Irlanda.
“…Passam meses. E de lá para cá nunca mais fui contactada pelo COM sobre ida a Cazaquistão. Pelo meio decidi seguir para África do Sul, donde continuei a ligar para o presidente da federação, que continuou a não me atender, até que no dia 9 de Janeiro de 2015 comentou a minha foto no fecebook dizendo: olá campeã! Sua localização? Assunto urgente para se tratar sobre a sua bolsa na segunda-feira, dia 12 de Janeiro. Se apresente no COM. Urgente”.
A resposta da pugilista foi a seguinte:
– “Boa noite senhor presidente. Estou na África do Sul. Não poderei chegar ai na segunda-feira. Vou pedir ao meu tio para me representar, o mesmo peço a federação. Comecei a treinar dia 2 de Janeiro. Estou no mesmo clube do ano passado. Não podia ficar parado à espera que o COM decidisse sobre o meu futuro. O que seria de mim? Tinha que treinar. Boa noite. Aguardo pela resposta da federação”.
A atleta prossegue com a narração e afirma que “no dia 14 de Janeiro, Big Ben respondeu-me afirmando que “o teu tio não apareceu na federação, muito menos no COM. E o prazo terminou sexta-feira, sob risco de colocarmos outra pessoa no seu lugar. Veja o que fazes até lá. Obrigado. Agradecia que desse resposta o mais rápido possível para melhor tomar decisão. Bons treinos e boas aulas. Aguardo atenciosamente. Boa noite”.
Maria Manuela responde:
– “Ele, o meu tio, esteve no COM, donde ligou para mim. Eu perdi cinco meses em Maputo o ano passado à espera da resposta do COM e da federação. Nada! Ninguém me atendia. Ninguém dizia nada. Cheguei a ficar frustrada por isso e quase abandonei o boxe. Hoje que voltei para recuperar o tempo perdido me dão o prazo de dois dias. Isso não é possível. Eu não voltarei a largar tudo para simplesmente vir a Maputo. Estou a treinar nas melhores condições e a estudar. Não posso de nada largar tudo por uma incerteza. Se for para enviar minha documentação para se tratar do visto, aceito. Agora, para fornecer currículo do meu treinador e dizer em que condições estou a treinar não preciso de vir a Maputo”.
Manuela explica que “eles pediram ao meu tio currículo do meu treinador, minha caderneta, juntamente com dados da inspecção médica. Por incrível que pareça, quando foi do visto para Irlanda nada disso me foi solicitado.”
A história caminha para o fim e novos dados surgem.
“Recebi do COM mensagem para que fosse receber valor da bolsa. Fiquei curiosa, pensando que fosse para receber os dólares do contrato da bolsa. Quando liguei para o COM, o senhor Nelson informou-me que era subsídio mensal de chapa no valor de dois mil e cem (2100) meticais. Eu perguntei-lhe se queria que eu viajasse para receber esse valor. Disse-lhe que não tinha sentido, pois o dinheiro que gastaria para transporte seria mais que esse valor de subsídio de chapa. Houve vezes que do COM eu recebia bips. Hoje estou aqui em Maputo, para dizer que é mentira a informação difundida de que eu desisti da bolsa”.
Fim da história?