Todas as gerações do desporto nacional estiveram representadas no adeus a Cândido Coelho, o desportista completo que faleceu domingo, 9 de Fevereiro de 2014, em Maputo, vítima de doença.
Antigos e novos dirigentes, técnicos, árbitros e atletas de quase todas as modalidades estiveram no seu velório, realizado na capela do Hospital Central de Maputo, que antecipou a cremação dos seus restos mortais, no cemitério de Lhanguene. Despedida merecida!
Tratou-se de digna homenagem a um desportista que em vida soube servir o desporto nacional, como atleta, técnico e dirigente. Um homem nascido para o desporto e a ele se entregou na totalidade.
Em vida, o malogrado foi da direcção Nacional de Educação e Desporto, co-fundador do torneio de futebol infantil SOBEC (BEBEC), treinador e dirigente no Desportivo de Maputo, treinador e Secretário-geral do Clube Estrela Vermelha de Maputo, Presidente da federação Moçambicana de Patinagem, entre outras funções desportivas.
Cândido Coelho não estava no desporto como biscateiro mas como parte dele. Sua profissão era fazer desporto para si e para o povo. Combinava sua habilidade física com a fidelidade da sua mente.
Talvez por isso todos os desportistas nacionais ficaram chocados com a sua morte. E foram prestar-lhe a última homenagem. Desde o vice-ministro da Juventude e Desporto e amigo de Cândido Coelho, Carlos Sousa “Cazé”, o presidente do Comité Olímpico de Moçambique, Marcelino Macome, entre outros dirigentes do desporto nacional.
“Se tivéssemos heróis do desporto, um deles seria Cândido Coelho”, murmurava alguém no velório. Na verdade, ele terá atingido o nível de herói desportivo pelos seus feitos.
Morreu quando ainda gostava de viver como quando jovem, na companhia de gente de todos extractos sociais, sempre despido de qualquer tipo de complexo.
Os mais novos presentes no “Adeus a Cândido Coelho” terão se interrogado: se este desportista é tão reconhecido por todos estes desportistas moçambicanos, porque não ter merecido uma cerimónia fúnebre maior? O próprio José Júlio de Andrade, ex-Secretário de Estado de Educação Física e Desportos, na entrevista que concedeu ao domingopara falar do seu companheiro e amigo de trabalho, disse que o seu velório teria sido melhor no Pavilhão do Desportivo de Maputo ou no Pavilhão do Estrela vermelha de Maputo, onde passou parte da sua vida a servir o desporto.
Busquemos talentos como ele
– José Júlio de Andrade, ex- Secretário de Estado de Educação Física e Desportos.
José Júlio de Andrade, que por muitos anos governou o desporto nacional exercendo o cargo de Secretário de Estado de Educação Física e Desportos, falando especificamente para o jornal domingo, na capela do Hospital Central de Maputo, considerou que mais do que chorar por aquele que para si foi o atleta mais eclético de todos os tempos deste país, é preciso que os actuais dirigentes desportivos de clubes criem mecanismos de busca de talentos como ele para os clubes.
“O Cândido Coelho foi o atleta moçambicano mais eclético de todos os tempos. Quando cheguei de Tanzânia em 1975 vim encontra-lo como atleta, mais como futebolista, e fui percebendo que era um atleta extraordinário, que morreu com recordes no atletismo que ainda não foram batidos. Foi-se com os seus recordes. Tinha condições atléticas fenomenais. É pena não ter ido ao estrangeiro. Se tivesse ido para uma academia dos Estados Unidos da América teria se tornado num campeão mundial” José Júlio de Andrade quando interpelado pela nossa reportagem no pátio do HCM, depois de se ter despedido para sempre do seu amigo e colega de trabalho a quem sempre tratou por Cândido.
Cândido Coelho praticou várias modalidades, mas foi nas de atletismo e futebol que mais se evidenciou.
“Se destacou mais no atletismo, mas era um bonito ponta de lança. Desporto era sua paixão”, referiu José Júlio de Andrade, que também brilhou nos campos de futebol.
No desportista admirado, havia o homem Cândido Coelho com valores que podiam ser bons para uns e maus para outros.
“Quer que o descreva como homem? A vida é assim, nós durante a nossa vivência cultivamos aspectos positivos e negativos e no fim fica o que pesou mais. No Cândido pesou o positivo, fica de lado o negativo. Que se renda a homenagem que lhe é devida. Por exemplo, eu penso que este espaço de velório foi pequeno para ele. Devia ter sido no Pavilhão do Desportivo ou no Pavilhão do Estrela Vermelha. Isto é muita gente. Revela que a popularidade de Cândido é extraordinária”.
FUNDADOR DO SOBEC (BEBEC)Cândido Coelho era pela formação do novo jogador, sempre no intuito de ver Moçambique a subir no panorama do desporto internacional. Participou na descoberta de muitos futebolistas internacionais nossos, o que é recordado pelo nosso interlocutor.
“Eu era muito amigo dele. Trabalhei muito com ele. E mais, ele e Luís de Brito é que criaram o SOBEC (BEBEC). Brito morreu, ele saiu, BEBEC acabou. O que eu quero dizer com isto? É que, muitas vezes o nosso desporto precisa do amadorismo, do empenhamento, do amor para com o clube ou para com a modalidade. O nosso dirigismo desportivo de hoje vale o que vale, apesar de haver dirigentes com muito valor”.
Naquele tempo, em que Cândido Coelho se empenhava na busca do novo talento, era notória a boa qualidade do nosso desporto. Hoje questiona-se se o que se traz ao clube é o que de melhor o país tem ou se todos somos olheiros do que emerge e do que se faz.
– Eu tenho estado a acompanhar de perto o desenrolar do nosso desporto. Lamento que hoje em dia os Mambas sejam aquilo que são. Eu falo muito nisto: em oitenta e seis fomos ao CAN, no Cairo, Egipto, na estreia de Chiquinho Conde. Do guarda-redes até ao extremo esquerdo todos eram para exportar. Hoje se tiras alguém é com muitas dificuldades, porque não se trabalha o talento que temos.
Acrescentou que “eu estava a falar com alguém dizendo porque não há uma lei que obrigue os clubes do Moçambola a terem escolas ou academias de formação. Seria uma lei regulamentada e oficializada. Nós temos talento, pá! Eu agora vivo num nono andar com varanda na qual quando espreito para baixo vejo miúdos num campo a fazerem maravilhas de futebol. É uma beleza de meninos de pé descalço, o que deve estar a acontecer em todo o país, mas ninguém os vai buscar para os clubes”, finalizou com a esperança de que um dia teremos outros Cândidos no nosso desporto.
Manuel Meque