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Fartura no Sul e sufoco no Centro e Norte

Por admin

A quadra festiva deste ano poderá ser recordada como a que menos agitação comercial produziu nos mercados de Maputo, Gaza e Inhambane. Dá a impressão de que os chefes de família não estão “nem aí” para a celebração do Dia da Família e para o Fim do Ano.

 Como resultado, os tradicionais especuladores estão a ver gorada a possibilidade de empolar preços, pois, a oferta supera claramente a procura.

O que se diz nas ruas é que não há dinheiro para gastar com festas de mesa farta, quando o mês de Janeiro está à espreita com todas as despesas que já se conhecem e que vão desde a batalha pelo material didáctico das crianças, uniformes, retoma da aquisição de materiais de construção, pagamento de dívidas, entre outros. “Não há dinheiro. É preferível ser comedido agora para não iniciar 2014 com dores de cabeça”, dizem alguns chefes de família abordados pela nossa Reportagem.

Com milhares de pais e encarregados de educação a pensarem desta forma, os vendedores dos principais mercados da cidade e província de Maputo até apanham uma soneca em pleno horário laboral, quando até ao final do ano passado levantavam os ombros e enchiam a boca para anunciar na maior cara de pau que o saquinho de batata custava mais de 300 meticais, quando durante todo o ano roçava timidamente os 200 meticais.

Aliás, é importante recordar que em finais de 2009, 2010 e 2011 os vendedores do mercado grossista do Zimpeto foram forçados a deitar para o lixo algumas toneladas de produtos, sobretudo batata-reno, que o povo não pôde consumir porque o preço era simplesmente bizarro.

Neste final do ano, com os preços estáveis e os mercados “despidos” de clientela em empurrões, pisadelas e cotoveladas, o que caracteriza os dias que correm na cidade de Maputo são os engarrafamentos que iniciam por volta das seis horas e vão tranquilamente até ao meio da noite em todas as direcções e sentidos de todas as ruas e avenidas. Ninguém percebe para onde rumam tantas viaturas de forma incessante, mas, está claro que se vai para algum lugar menos para os mercados.

Entretanto, nas cidades do Centro e Norte, com particular destaque para a Beira, em Sofala, e Chimoio, em Manica, apesar de a procura estar assim-assim, os vendedores de produtos alimentares há muito que duplicaram os preços, tendo como desculpa a crise político-militar de Muxúngue que está a obrigar os transportadores de mercadorias a terem muito mais do que coragem para atravessar o troço que vai do rio Save até à vila de Muxúngué.

Para o caso das províncias localizadas mais a norte do país, nomeadamente, Nampula, Cabo Delgado e Niassa, o poder aquisitivo tem estado a ser corroído a olhos vistos, porque todos os produtos manufacturados em Maputo ou importados da África do Sul só chegam àquelas paragens depois de inúmeros sacrifícios consentidos pelos camionistas, incluindo o risco de tombarem perante as balas disparadas por homens armados comandados por Afonso Dhlakama.

Ainda a propósito dos tiros que a Renamo, não se sabe por que caipirice, teima em disparar naquela área da província de Sofala, e porque um azar nunca vem só, as estâncias turísticas da província de Inhambane, localizadas a centenas de quilómetros do epicentro da tensão, estão igualmente às moscas porque a maior parte dos turistas sul-africanos e zimbabweanos que, por estas alturas povoam aquelas praias simplesmente decidiram cancelar as reservas para acomodação.

Conforme revelam os gestores dos hotéis, lodges, resorts e casas de férias, os turistas receiam levar um balázio enquanto dão um mergulho nas águas cristalinas das praias de Tofo, Morrungulo ou Závora, ou serem vítimas de emboscadas assassinas durante a viagem de ida ou de volta.

Consta que há um esforço redobrado, e preces à mistura, com vista a levar os turistas estrangeiros a compreenderem que as praias e estâncias turísticas da costa de Inhambane e Gaza estão a milhas do barulho e que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) estão em prontidão para neutralizar qualquer esboço de ameaça à ordem e tranquilidade pública.

Prova inequívoca de que a quadra festiva deste ano não está a ser vivida como nos tempos que lá vão, pode ser observada no Terminal da Junta, em Maputo, lugar de onde partem autocarros para os mais variados destinos do país. Se nos outros anos aquele parque fica abarrotado de gente com todo o tipo de trouxa, até ao fecho da nossa edição, o movimento era de dias comuns. Sem aquela habitual lengalenga.

Uma das nossas equipas de Reportagem fez questão de ir posicionar-se na Junta. Caminhou pelos quatro cantos do recinto, conversou com vendedores, cobradores, motoristas e passageiros e constatou que, de facto, “os tempos são outros”. A maior parte dos passageiros que para ali afluem quase que a conta-gotas são moçambicanos provenientes da África do Sul e pretendem seguir para as suas origens.

Segundo nos foi revelado, o movimento está fraquinho, fraquinho a ponto de só partirem dois autocarros para cada capital provincial que se localiza para lá do rio Save. Porém, e como pura ironia, os transportadores que tem como destino as províncias de Gaza e Inhambane vivem um cenário exactamente inverso. Há mais passageiros que transporte. Homens, mulheres e crianças são obrigados a esperar sentados no chão pela chegada de um autocarro ou mini-bus. 

Este é o quadro que se vive no país, num ano em que o Banco de Moçambique acredita que o crescimento real da economia rondará os sete por cento, conforme previsão feita nos princípios do ano, conforme revelou o Governador do Banco de Moçambique, Ernesto Gove, na cerimónia alusiva ao fecho do presente ano económico.

Segundo Gove, ao longo deste ano, o indicador do nível geral de preços no consumidor estabilizou, tendo mesmo desacelerado em cinco meses consecutivos, entre Maio e Setembro, fazendo com que a inflação anual medida pelo Índice de Preço ao Consumidor (IPC) da cidade de Maputo se situasse em 3,34 por cento até Outubro de 2013 e a inflação média em 4,15 por cento, ou seja, em linha com os parâmetros estabelecidos para o presente ano, que é de uma variação média anual de preços de 5,6 por cento.

“Esta tendência é igualmente observada quando se analisa o comportamento do IPC no país inteiro, que agrega as cidades de Maputo, Beira e Nampula”, disse Gove para depois acrescentar que “a estabilidade do nível geral de preços no presente ano resulta de vários factores combinados, nomeadamente, a resposta positiva do sector real da economia ao empreendedorismo dos nossos agentes económicos no aumento da produção de bens e serviços, a coordenação de políticas, particularmente a monetária e fiscal-orçamental, sem descurar a estabilidade do Metical no mercado cambial doméstico, num quadro em que prevalecem as medidas de mitigação dos efeitos da crise financeira internacional, instituídas pelo governo há alguns anos”.

Apesar de satisfeito com os resultados macroeconómicos, Ernesto Gove acentua que “a manutenção da paz é essencial para consolidar a estabilidade macroeconómica e do sector financeiro, bem assim para a materialização dos objectivos consagrados para 2014, que prevêem um crescimento real do Produto Interno Bruto em 8 por cento, uma inflação anual de 5,6 por cento e um nível de reservas internacionais com pelo menos quatro meses de cobertura de importações de bens e serviços não factoriais”.

 

Jorge Rungo

Fotos de Jerónimo Muianga

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