Novembro último foi um mês especial para o multifacetado artista Casimiro Nhussi. Apresentou o seu segundo disco “Gweka” e, mais importante ainda, actuou pela primeira vez como solista na sua terra natal, Cabo Delgado. A beira de completar meio século de vida, Nhussi, que vive no Canadá desde 97, tem em carteira diversos projectos que gostaria de implementar em Moçambique.
Casimiro Nhussi fundou, em Winnipeg a NAfro Dance Productions para dar continuidade a sua carreira artística iniciada em 1982 na Companhia Nacional de Canto e Dança. Ao longo dos últimos anos coreografou diversas peças e viajou pelo mundo fora. Agora, a par da dança, iniciou uma carreira musical que já lhe rendeu vários prémios.
A música, que sempre o acompanhou enquanto bailarino, agora ganhou outros contornos através dos discos Makonde (2010) e Gweka (2013). Ambos discos foram largamente premiados no Canadá na categoria de Música do Mundo. Ele próprio foi eleito Melhor Artista Africano radicado no Canadá (2012). É obra.
Recentemente, Casimiro Nhussi esteve em Moçambique com o objectivo de lançar o seu segundo disco de originais – Gweka. Os espectáculos, sob o ponto de vista artístico, foram um sucesso absoluto, tanto em Maputo no Centro Cultural Franco Moçambicano, quanto em Pemba, Cabo Delgado, no Festival Wimbe.
Na hora da partida, de regresso para o Canadá, Nhussi aceitou partilhar com o “domingo” os seus planos para os próximos anos, incluindo o sonho de ter, em Moçambique, um espaço para a transmissão dos seus conhecimentos e experiências para os mais novos.
TENHO VONTADE DE AJUDAR
Próximo ano, 2014, vai fazer 50 anos de vida e 30 de carreira profissional. Momento para um breve balanço do percurso…
Sinceramente faço um balanço positivo. Desde que abracei a carreira artística tenho vivido experiências fantásticas; isso não quer dizer que não houve dificuldades… a verdade é que foi preciso procurar soluções para os desafios e avançar. O importante em tudo o que se faz é não perder a capacidade de sonhar.
E pelos vistos Casimiro continua um sonhador… agora mais virado para a música…
O ponto é que próximo ano vou fazer 50 anos… apesar de ainda estar em forma, penso que é altura de começar a explorar outras vertentes artísticas. Na realidade a música não é nova na minha vida. Participei na gravação do disco da Companhia Nacional de Canto e Dança (Walawasa) em 84. Além de que a música acompanha sempre a dança… depois tive a experiência do Kinamataminkuluty. Na realidade é a continuidade de uma coisa que venho fazendo só que com mais visibilidade.
Onde fica o bailarino e coreografo no meio da música?
Eles estão sempre lá. Nos meus espectáculos há sempre uma combinação destes três “Casimiros”. Danço sempre… mesmo nos ensaios danço. A dança é um dos meus pratos fortes… sinto-me vivo dançando!
Isso exige muito do físico…
Cuido do meu físico com o mesmo rigor dos tempos da Companhia Nacional de Canto e Dança. Na realidade continuo a dançar profissionalmente nas minhas coreografias. Continuo a dar aulas de dança. Tenho que estar bem fisicamente para isso…
Muito bem. Mudando de rumo… foi recebido pelo Ministro da Cultura, Armando Artur… qual é que era o objectivo do Ministro?
Bem… conversámos sobre vário assuntos… há uma ideia interessante sobre a criação de uma verdadeira indústria cultural no nosso país… é verdade que essas coisas não se criam com base em documentos mas o facto de o Ministério ter agora uma direcção específica para este tema é já uma grande vitoria. Vamos ver os desenvolvimentos.
Foi só isso?
Não. Falamos do Festival Nacional da Cultura que vai ter lugar próximo ano em Inhambane… aliás, o ministro disse-me que eu era uma das personalidades convidadas especialmente para o Festival. Então próximo ano estarei cá… vamos ver o que é que se poderá fazer.
Consta-nos que também tens planos pessoais para nós.
É assim… aprendi muita coisa aqui antes de me radicar no Canadá. A CNCD foi uma verdadeira escola para mim. O David Abílio foi um professor em muitos aspectos. Essa experiência foi de grande utilidade quando decidi montar uma companhia no Canadá. Hoje a NAfro Dance é uma referência no que diz respeito à dança contemporânea africana de tal sorte que já recebe apoios institucionais. No ano passado, para assinalar 10 anos de existência da Companhia, fizemos um festival internacional com grupos da Europa, África e América. Agora exigem-nos que passemos a fazer um festival similar todos os anos… é um desafio muito grande.
Mas os planos?
Estava a contextualizar… o que quero dizer é que nestes anos aprendi muitas coisas que gostaria de aplicar no meu país. Hoje sei o que é dirigir uma companhia grande. Acumulei experiências a vários níveis; desenhar projectos, procurar financiamentos, estabelecer parcerias, fazer pesquisas de mercado, gerir um teatro, etc. são estes elementos que gostaria de trazer para o meu país e partilhar isso tudo com os artistas da minha terra.
Isso inclui abrir uma companhia de canto e dança?
Absolutamente. Esse é um sonho que gostaria de realizar. É verdade que não depende única e exclusivamente da minha vontade. É preciso que haja condições objectivas e abertura suficiente para que o plano se concretize. Como disse, estou a gerir um teatro com uma programação anual que inclui oficina, aulas e espectáculos… gostava de poder fazer isso aqui…
Então o regresso está para breve?
Aqui é minha terra. Nasci aqui. Na realidade eu quase que nunca sai daqui (risos). Todos os anos venho para aqui beber da fonte a nossa cultura. Os meus discos reflectem isso; as músicas são baseadas nos nossos ritmos e nas nossas línguas. Um dia eu volto em definitivo mas por enquanto acho que tenho ainda uma voz para gritar bem alto “Moçambique”. Eu sinto que temos que falar um pouco mais alto lá fora. Ninguém me mandou fazer isso… sinto que é uma obrigação moral para qualquer moçambicano falar alto e bom som que é de Moçambique. Os outros fazem-no. Nós também temos que falar alto.
SOZINHO MAS NEM TANTO…
Entre dois discos – Makonde e Gweka – Casimiro foi eleito melhor artista africano no Canadá, para além de outros tantos prémios, incluindo convites para actuar nos Estados Unidos da América. Esse reconhecimento parece não ter tido eco entre nós, a julgar pelo que se disse na Comunicação social, aquando dos espectáculos…
Bem… não gostaria de falar disso. O meu produtor (Belmiro Adamugy) poderia falar melhor sobre isso… o que posso fazer é agradecer aqueles que acreditaram e deram a sua mão. O BCI, a LAM, o Fundac e a SMS e a Imagem Real foram impecáveis… eu acho que ainda há muito por fazermos em prol das artes. O que me tranquiliza é que os espectáculos, com todas as dificuldades, sob o ponto de vista artístico foram bons… isso é o que sinto e oiço dos que me foram ver. As pessoas gostaram de tal sorte que já há convites para voltar próximo ano… vamos lá ver como é que as coisas vão correr.
Vamos ver… nesses planos para 2014, está inclusa coreografia? Isto é vai montar alguma coisa com bailarinos moçambicanos?
Bem… não sei ainda. Estou a espera do convite oficial para o Festival Nacional e ver em que termos posso dar a minha contribuição. Fora isso, tenho planos que ainda estão no forno para assinalar os meus 50 anos de vida e 30 de carreira. São muitas ideias mas o mais importante é que estou disponível para contribuir para o desenvolvimento das artes no meu país… se houver condições… porque acredito que o que aprendi no Canadá, onde o mercado é muito mais exigente, pode ser útil aqui.
HOMEM DE MIL OFÍCIOS
Casimiro Nhussi é bailarino, percussionista, actor de cinema e teatro, compositor e interprete, instrumentista – toca tambores, timbila e Mbira. Compôs música para o filme canadiano” Mind Me Good Now” e outras para a Companhia Nacional de Canto e Dança, Associação Cultural Tchova Xita Duma, Grupo Teatral Mbéu, Grupo Kalahari, Tambores Bafana e NAfro Band. Também tocou com bandas como Million Civilian, Desert Caravan e Afri-Can Band.
Gravou vários temas enquanto membro da Companhia Nacional de Canto e Dança que passam na Rádio Moçambique, com particular destaque para a música “Mwana” com participação de Moreira Chonguiça. Participou no filme “Comédia Infantil” para além de ser membro fundador do grupo de afro-jazz “Kinamataminkuluty.
Natural de Moçambique, Cabo Delegado, Casimiro Nhussi vive no Canadá onde tem trabalhado com a The School of Winnipeg Contemporary Dancers, Trip Dance, RWB Recreation program & Ruth Canfield Dance. Paralelamente a essas actividades, dá aulas em danças africanas.
Actualmente é director artístico e fundador da única companhia de dança contemporânea africana no Canadá, a NAfro Dance Productions
Desde 1982 que Casimiro Nhussi vive profissionalmente da dança, altura em que se juntou a Companhia Nacional de Canto e Dança onde foi primeiro bailarino e depois director artístico. Em 1997 partiu para o Canadá
Coreografou dezenas de peças e bailados, com particular destaque para “Ode à Paz”, “Árvore Sagrada”, “Raízes”, “À Volta Da Fogueira”, “Se As Minhas Lágrimas Pudessem Pintar”, “Mapiko”, “Deixe-Me Dançar Antes De Partir”, “Pudya” e “Adaptação Das Espécies”.
Actuou e ensinou dança em diferentes países, nomeadamente Canadá, Áustria, Alemanha, Itália, Dinamarca, Noruega, Suécia, Suiça, Espanha, Rússia, Brasil, Polónia, República Checa, Eslovénia, Estados Unidos da América, Macau, Lituânia, Portugal, Bulgária, Ilhas Reunião, Tanzânia, África do Sul, Namíbia, Angola, Malawi, Zâmbia e Zimbabwe.