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SOBRE UM FIM DE COLABORAÇÃO

Por admin

Faz bem duas décadas que escrevo semanalmente para o domingo. Apreciei a sua linha editorial, as diferentes opiniões aí expressas, as reportagens. Muitos leitores diversas vezes expressaram o seu apreço pelos meus escritos. Obrigado.

De há uns tempos para cá constato que o semanário navega entre a dignidade e a submissão a interesses mais ou menos obscuros, surgindo artigos com nítido pendor racista e calúnias baixas, tentativas de denegrir a dignidade e a honra de quem merece mais.

Falei com o Director que me reafirmou, pessoalmente, ainda no dia 25 de Outubro, pela tarde, o seu pesar pelos artigos de teor racista e calunioso. Inclusive mostrou-me o editorial do domingo anterior que condenava o racismo, o tribalismo, o regionalismo. Pedi que pedisse desculpas públicas pelos artigos caluniosos. Prometeu. Não o fez o jornal.

Normal que por razões sérias e citando a fonte se reproduza este ou aquele artigo de interesse de outro periódico. Absurdo que se copiem, sem mencionar a origem, artigos, isso frisa a desonestidade. Gravíssimo que esses plágios se destinem a propagar calúnias e racismo surgidos anteriormente em pasquins de terceira ordem. Não faz sentido que para se responder ou comentar artigo, reportagem, entrevista surgida numa outra publicação domingo se torne o porta-voz da baixeza e da cobardia. Algo nisso violenta o Código da Deontologia Profissional da nossa comunicação social.

Quando o jornal plagia, porque não cita a fonte, artigos nitidamente racistas e caluniosos, ele assume uma nova linha editorial, que me parece fascizante.

Não questiono o direito à opinião, mas não existe o direito a propagar opiniões racistas e caluniosas. Com o fim do colonialismo e do “apartheid” todos acreditamos que se valorizava a nossa moçambicanidade assente na diversidade, sim, mas em princípios também.

Não creio que alguém se engrandeça rebaixando outros. O nanismo intelectual e ético de uns não constitui critério da grandeza de alguém.

Nas cortes reais surgem, por vezes, uns pobres desgraçados que acreditam dever incensar quem dirige, ignorando que não se esconde a verdade com turíbulos de incenso postos na língua ou pena. No processo os lambe botas mesquinhos pensam garantir uma ascensão ao poder, monetário, estatal ou político. Visões curtas.

Com pesar vou processar o semanário por difamar-me, publicando a cópia de um pasquim que me acusava de traficar pedras e cesso toda e qualquer colaboração com uma publicação que subverte os princípios pelos quais sempre pugnou.

Já em 1958 comecei a lutar pela pátria. Colaborei na organização da fuga dos estudantes em Portugal em 1961. Fiz parte do grupo de estudantes na Europa que apoiou Mondlane a criar o movimento unitário de libertação, a FRELIMO, em 1962. Trabalhei sob o Presidente Mondlane e Samora, contribuí para a edificação do nosso Estado e para as tarefas internacionalistas.

Não ocupo qualquer lugar em órgãos partidários, estatais, empresariais, públicos ou não.

Nas ruas, em Maputo e nos distritos gente anónima saúda-me com carinho, amizade e respeito. Essas pessoas indiciam a avaliação que me fazem os moçambicanos, os meus compatriotas sem distinção étnica, de fortuna, de tonalidade da pele.

Com mais de setenta anos de idade e História feita de dignidade, não desejo continuar alvo permanente de calúnias e ataques racistas. Cesso a minha colaboração com este semanário.

Edmund Burke, no século XVIII, escreveu que para o triunfo do mal bastava que os homens bons nada fizessem. Se accionistas, proprietários em nada se opõem ao que acontece, só há duas leituras, a de concordarem com o que se publica, ou de estarem com medo. Só recordo que nem a PIDE, nem o fascismo, nem o “apartheid” ganharam. Ao deixar de escrever crónicas, eles não vencem, apenas perderam.

Um grande agradecimento aos leitores que abraço, assim como ao antigo domingo,

Sérgio Vieira

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