POR EDSON MUIRAZEQUE *
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A crise política no Níger abriu um braço-de-ferro entre os militares golpistas e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que está a colocar uma ameaça existencial à organização regional. Depois de os militares terem efectivado um golpe de Estado, a CEDEAO impôs sanções e emitiu um ultimato para que os golpistas reponham a ordem constitucional. Quando estas linhas estavam a ser escritas os golpistas continuavam inamovíveis na sua posição de que se manteriam no poder, apesar da ameaça de uso de força pela organização regional e a CEDEAO ainda não havia cumprido a sua promessa, mas o prazo do ultimato ainda não tinha vencido. No entanto, a crise política em si abre espaço para duas linhas de análise: primeiro, olhando para as manifestações populares, que aparentam demonstrar uma onda de contestação contra a França nas suas antigas colónias; segundo, olhando para o significado do braço-de-ferro instaurado entre os golpistas e a CEDEAO, que indicia uma ameaça existencial à organização.
No passado dia 26 de Julho, um grupo de militares apareceu na televisão nacional do Níger e anunciou que havia derrubado o governo. Amadou Abdramane, porta-voz do exército do país, informou que “as forças de defesa e segurança … decidiram pôr fim ao regime….”, tendo anunciado que as fronteiras do país tinham sido fechadas, tinha sido imposto um toque de recolher obrigatório em todo o país e todas as instituições do país estavam suspensas. Dois dias após o anúncio do derrube do governo, o então chefe da guarda presidencial, Abdourahmane Tchiani, autoproclamou-se presidente de um governo de transição que designou de “Conselho Nacional para a Salvaguarda (CNSP) da Pátria”. Para justificar a sua acção, Tchiani alegou que a sua intervenção foi necessária para evitar “o fim gradual e inevitável” do país. Não tendo havido sucesso nas tentativas de encontrar uma solução negociada para a reposição da ordem constitucional, a CEDEAO impôs, a 30 de Julho, um prazo de uma semana para os militares restituírem Mohamed Bazoum à presidência, sob pena de a organização regional usar a força contra os golpistas.
O golpe de Estado no Níger é o terceiro a ocorrer na África Ocidental, desde 2022, todos em países antigamente colonizados pela França. Primeiro foi no Mali, em 2022, segundo foi no Burkina Faso, no passado mês de Janeiro, e, no passado mês de Julho, o Níger juntou-se à lista de países cujas chefias militares da África francófona estão a privilegiar a desvirtuação da ordem constitucional para tomar o poder. Pelas manifestações que se assistem pelas imagens televisivas, há, nos três casos, um aparente desencanto dos militares e das populações na África francófona em relação à antiga potência colonizadora. Nos três casos viram-se manifestantes a favorecerem os golpes dos militares, ao mesmo tempo que queimam bandeiras francesas e elevam a bandeira e símbolos da Rússia, a maior “dor de cabeça” do Ocidente. Ao que parece, na África Francófona, os líderes que mantenham relações de proximidade com Paris, ainda que tenham sido democraticamente eleitos, tornam-se vítimas do desencanto dos militares em relação à antiga potência colonizadora e da percepção popular de eles serem fantoches de Paris. Leia mais…