Calton Cadeado, docente no Instituto de Relações Internacionais (ISRI), diz que a atitude da Renamo tem como objectivo primordial a inviabilização das eleições autárquicas de Novembro
próximo e forçar um hipotético governo de unidade nacional.
“Esta estratégia visa essencialmente forçar o adiamento das eleições que se avizinham, até porque eles já vieram a público, por diversas ocasiões, reiterar que tudo irão fazer no sentido de tornar impossível a realização das eleições autárquicas aprazadas para Novembro próximo”,disse Calton Cadeado, sublinhando que é um direito legítimo qualquer das partes apresentar as questões que julgar pertinente.
No entanto aquele docente referiu que, no caso vertente, esse direito pode não estar a ajudar para o prosseguimento do diálogo, tendo em vista a aproximação das posições.
“Neste momento é importante dizer que estamos perante um diálogo e não necessariamente uma negociação, porque para viabilizar a negociação, as pré-condições que são colocadas à mesa não ajudam. A outra questão é de que as pré-condições também podem nos dar um sinal de que a Renamo tem outra estratégia por detrás deste processo que é inviabilizar um determinado processo, ou arrastá-lo por mais tempo, de modo a tirar os dividendos possíveis. Portanto, arrastar as conversações para poder ganhar tempo para o adiamento das eleições autárquicas de Novembro próximo”,disse Cadeado.
Sobre que significado tinha o silêncio da Renamo no âmbito das eleições que se avizinham, Calton Cadeado referiu que pode ser uma das formas de encontrar uma plataforma do diálogo comum.
“A grande questão de todo este imbróglio é que parece que há um interesse político, que são os próximos pleitos eleitorais. Isto é, quer-me parecer que há um exercício que está sendo feito no sentido de prolongar este diálogo até à data das eleições”,disse Cadeado, para depois acrescentar:
“Que está com medo das eleições não é uma informação para se negar, mas também há que dar o benefício da dúvida, que é o facto de estar à procura de confiança na plataforma do diálogo. Mas isso é contraditório, porque neste momento da segunda ronda, já tivemos pronunciamentos que nos remetem para uma cordialidade. Então, porquê trazer esses novos elementos, como as questões prévias?”
Acrescentou que no caso do género, quando alguém apresenta questões prévias, a outra parte também lhe é reservado o mesmo direito. “Geralmente, em questões desta natureza, se uma parte coloca as questões prévias a outra parte também devia pôr na mesa as suas contra propostas”.
Num outro momento, Calton Cadeado referiu que a pertinência de todo este exercício é a observância da Constituição, sob o risco de anular todos os esforços democráticos que vêm sendo desencadeados desde o ano de 1990, com a introdução do multipartidarismo.
“Se procurarmos soluções políticas que prejudicam a solidificação do Estado, o prejuízo disso, é que amanhã teremos que novamente que mexer nos pilares desse Estado permanentemente, quando já temos uma base sólida. Quando procurar soluções fora do âmbito da lei fundamental, estamos abrir espaços para que os pilares do Estado sejam questionados”,explicou Cadeado, para quem é preciso garantir o respeito à lei fundamental.
Sobre a questão da distribuição da riqueza, afirmou que a Renamo pode ter razão, mas peca por fazer aproveitamento político da situação. “Alguns pontos que eles levantam têm a sua lógica. Mas temos que ter cuidado com os interesses políticos por detrás disso. O problema está na forma como eles apresentam a questão. Estão a reduzir a distribuição apenas à nomenclatura, mas é preciso falar da distribuição dos recursos nos distritos, nas províncias e não se reduzirem apenas à questão das elites”.
Em relação à questão da legislação eleitoral, o nosso interlocutor afirmou que é uma matéria cujos procedimentos estão bem claros, até porque há necessidade de se caminhar para a profissionalização dos órgãos eleitorais.
“Nós temos que caminhar para um processo de solidificação das instituições, e isso passa necessariamente pela profissionalização da CNE. Essa acção não pode ser conseguida com a paridade ou partidarização dos órgãos de gestão eleitoral. Aliás, se insistirmos nessa questão, podemos tornar os órgãos disfuncionais”,disse Cadeado.
Ainda sobre a CNE, Calton Cadeado é de opinião de que o barulho que se levanta visa desacreditar os avanços registados na gestão dos processos eleitorais. “Estamos a conduzir o debate para um lado errado. Todos nós somos políticos, ou seja, não há ninguém que não tenha preferência política. Se existe uma pessoa nesse sentido, então, no dia da votação ou se abstêm ou coloca um voto nulo, porque a partir da altura que vai à votação tem uma cor partidária”.
Acrescentou que também é preciso não colocar de lado a teoria de conspiração. “È importante admitir a teoria da conspiração, quer dizer, em que contexto a foto do actual presidente da CNE vestido com uma cor de um partido político aparece na Imprensa. Trata-se de uma tentativa de inviabilizar as próximas eleições, mas o mais estranho é que a própria Sociedade Civil está a deixar para que o debate seja conduzido neste rumo que ao final do dia lhe prejudica a ela própria”.
Aliás, comentando especificamente sobre o barulho que se levantava em torno da candidatura de João Leopoldo da Costa, afirmou que há vários interesses obscuros por parte de quem está a contestar. “A ONP pode estar a ser guiada por alguém com objectivos políticos inconfessáveis, sobretudo os económicos, no âmbito da teoria de conspiração, mas também pode haver um interesse por parte desta organização de repensar a sua posição”.