Em Chiaquelane, tecto tem o significado de lona ou tenda para abrigar uma das centenas de famílias que para ali foram parar por causa das enxurradas. Só que a distribuição
dessas tendas ganhou critérios pouco claros, com algumas pessoas a falarem de apadrinhamento ou afinidade entre o chefe do quarteirão, das dez casas ou do bairro onde a pessoa reside em Chókwè ou Lionde, responsáveis pela atribuição de lonas, depois de prévia inscrição junto dos mesmos, e os necessitados.
Numa altura em que o centro de acomodação de Chiaquelane, duas semanas depois da sua abertura, continua a registar entradas de pessoas vindas de Chókwè, Lionde, Guijá, Chilembene e Massingir, o cenário de acomodação está longe de deixar de ser dramático.
Embora Chiaquelane seja o único sitio para onde todos recorrem neste período de aflição, nem tudo corre às mil maravilhas, pois muitos ainda reclamam a falta de comida, tendas, cobertores, entre outros víveres.
Esta situação é mais complicada, quando de repente chove, como aconteceu ao longo da semana. Ninguém sabe onde esconder a pouca comida de que dispõe, o lençol, a manta e a esteira, sobretudo porque, às vezes, tal fenómento se verifica na ausência dos donos bens, preocupados em ganhar a vida na cidade. Pior ainda é quando chove de noite, com as crianças ao colo. Alguns pais garantem que tiveram de recambiar as crianças para as respectivas casas na cidade de Chókwè devido à chuva que caiu, pois corriam o risco de contrair doenças, o que parece um contra-senso.
Com a comida trazida de casa já a minguar aliada a uma distribuição deficitária dos produtos, pois já há relatos de famílias que apenas receberam comida uma única vez desde que ali estão, teme-se que a situação venha a agravar-se nos próximos dias.
O “JANTAR” EM CHIAQUELANE
Nélio Novela, uma das vítimas das cheias, desde dia 23 de Janeiro vive debaixo do cajueiro, junto com a sua a família. Encontrámo-lo quando se preparava para “jantar”. Pouca coisa. Arroz e feijão e um pouco mais.
A família Novela é composta por oito membros, entre os quais dois bebés gémeos. Ele contou que desde que chegou ainda não recebeu nenhum produto destinado aos reassentados e que continuam a viver numa situação desoladora.
Ele compra os produtos na Macia com o pouco dinheiro que lhe resta no bolso para poder alimentar a sua família. “Nem tudo está mal, mas também posso dizer que as pessoas que estão à frente da distribuição das lonas e produtos alimentares não estão a agir com a devida transparência. Elas não sentem o que passamos. Na última quarta-feira, recebemos a visita do senhor governador da província e quando aqui chegou, observou que vivemos com os nossos gémeos ao relento. De imediato orientou ao administrador local para que fossemos fornecidos lonas. Mas até às 18 horas da quinta-feira, não havíamos recebido nada, apesar da ordem superior”, queixou Novela.
Novela olha para a situação com tristeza, pois na tarde da quarta-feira havia chovido e na altura da ocorrência tinha ido à fila para ver se recebia a lona prometida, o que não aconteceu, porque nunca são suficientes para todos.
“Choveu durante 30 minutos. Os bens molharam todos e agora estamos a pensar o que fazer com os bebés esta noite. A nossa sorte é que ainda não sentimos a presença de mosquito. Dizem que temos que ter esperança é por isso que continuamos alimentando o coração, mas sempre com tristeza, frisou Novela.
Ofélia Timbe está em Chiaquelane na companhia da sua irmã. Ela trabalha numa pastelaria em Chókwè, enquanto a irmã é professora primária. Como ambas são mães, a preocupação reside no facto de estarem a dormir ao relento, pois ainda não haviam recebido lona e “certeza” para purificação da água.
Entendem que a situação está complicada, por isso é difícil dar comida a toda gente. Daí que elas usam o dinheiro que possuem para aquisição de alimentos.
“As nossas mantas e roupas estão molhadas devido à chuva que caiu. Por isso, pedimos a quem de direito que nos dêem lonas para nos abrigarmos”, apelou Ofélia.