Desengane-se quem pensa que os conflitos pela posse e controlo de recursos naturais só gera conflitos em países fracos. Eles, os conflitos, ocorrem também naqueles espaços teoricamente com instituições fortes. O caso do conflito que opõe a República Cipriota Grega, a Grécia e a União Europeia, por um lado, e a Turquia e a República Turca de Chipre do Norte, por outro lado, é disso prova. Em causa está a descoberta, nas águas territoriais da ilha do Chipre, de imensas reservas de gás natural e petróleo, tendo a República Cipriota Grega assinado contratos de exploração com as multinacionais italiana ENI, francesa Total e americana ExxonMobil.
Em reacção à atitude da República Cipriota Grega, a República Cipriota Turca tem concedido licenças à Turquia, seu único defensor e aliado, para a prospeção e exploração do gás e petróleo. É na sequência dessa reacção que a Turquia tem enviado navios de prospecção para a República Cipriota Turca, o último navio de prospecção enviado foi Yavuz, no dia 16 de Julho corrente, para o desagrado do Ocidente (EUA e União Europeia). Importa realçar que parte da explicação deste conflito encontra-se na fragmentação dos impérios Otomano (1914), por uma lado, e Britânico, por outro (1960), que resultaram na emergência da “Questão Cipriota”.
Por Questão Cipriota designa-se o conflito que opõe a República Cipriota Grega e a República Cipriota Turca. Na realidade, a Ilha do Chipre, na sua totalidade, esteve sob o domínio do império Otomano (Turquia) entre 1571 e 1914, e sob o domínio britânico entre 1914 e 1960, apesar de a presença britânica ter iniciado em 1878. Após a independência, o líder greco-cipriota Makario III iniciou campanhas violentas contra os turco-cipriotas, o que levou a retirada destes últimos para a periferia (zonas menos importantes da ilha, principalmente no Norte) e o envio das United Nations Peacekeeping Force in Cyprus, Pelas Nações Unidas. Na sequência do golpe de estado de 15 de Julho de 1974 protagonizado pelos gregos e gregos-cipriotas contra o governo de Makario III, o governo turco conduziu uma operação militar denominada Operação Átila para proteger os turco-cipriotas.
A intervenção militar turca resultou na ocupação de 37% do território e em 1975 a Turquia proclamou a independência desse território sob a designação de “Estado Federado Turco de Chipre”. Em 1983, o estado mudou de nome para “RepúblicaTurca de Chipre do Norte”. Contudo, a RepúblicaTurca de Chipre do Norte é apenas reconhecida pela Turquia, enquanto a República Cipriota Grega tem o reconhecimento internacional e é membro da União Europeia desde 2004. É esta qualidade de membro da União Europeia que legitima as sanções da União Europeia contra a Turquia.
Assim, os ministros da União Europeia dos Negócios Estrangeiros concordaram em: (i) suspender as negociações com a Turquia sobre o Acordo Bilateral de Transporte Aéreo, (ii) não levar por diante o Conselho de Associação e outras reuniões bilaterais previstas com responsáveis turcos, (iii) reduzir a assistência pré-adesão turca em 2020 e (iv) rever as linhas de crédito à Turquia. Leia mais…
Por Paulo Mateus Wache*