Os actores da crise política sudanesa alcançaram, no dia 5 de Julho, um acordo que pode permitir o retorno da ordem e segurança públicas. A crise que teve início a 19 de Dezembro de 2018 desembocou na deposição, pelos militares, de Omar Al Bashir em Abril de 2019. Os militares acreditaram que a crise iria cessar após a queda de Al Bashir e decidiram controlar o poder. Contudo, os civis continuaram com as manifestações exigindo, desta feita, que o governo de transição seja dirigido pelos civis. Os militares recusaram-se a ceder o poder e recorreram à violência para intimidar e manterem-se no poder.
O braço-de-ferro entre os civis e militares tem sido gerido pela União Africana que indigitou Mohamed El Hacen Lebatt como mediador. Realce-se, também, o papel fundamental que a Etiópia tem estado a desempenhar na resolução da crise. Depois de várias rondas de negociação, no dia 5 de Julho, os civis e os militares concordaram em instaurar um Conselho Soberano com alternância de poder, num período de três anos. O Conselho Soberano, que inclui militares e civis, será presidido, primeiro, por um militar num período de um ano e meio e, depois, será presidido por um civil num período análogo.
Contudo, as dificuldades das negociações levam a crer que a implementação deste acordo será um desafio para os sudaneses por duas razões: (i) o período de transição é muito longo e (ii) a assimetria de poder.
Em relação ao longo período de transição, parece que três anos é tempo demais para uma transição motivada por protestos. Porque durante três anos a situação económica, que levou à queda de Al Bashir, pode deteriorar-se levando à perca de legitimidade do Conselho Soberano. Um governo civil-militar pode não ter concentração suficiente, devido às competições pelo poder e a diferenças de visões de gestão do estado, para gerir novas facções de manifestantes não representados pelos civis no governo. Um ano seria tempo suficiente para organizar-se eleições com vista à instauração de um governo legal e, quiçá, legítimo.
Quanto à assimetria de poder, importa realçar que o Conselho Soberano é composto por dois grupos. Por um lado, estão os militares que, por natureza, são estrategas e depositários de arsenal bélico e, por outro, estão os civis que não têm nenhum meio que lhes confere poder para além da vontade de governar e talvez algum apoio popular. A assimetria está evidente no acordo alcançado. Basta recordar que os militares serão os primeiros a dirigir o estado durante um ano e meio, só depois os civis irão gerir o estado. A questão que fica é: será que os militares irão cumprir o acordo de entregar o poder depois do período previsto? Leia mais…
Por Paulo Mateus Wache*