O Presidente da República voltou a mostrar, esta semana, a sua preocupação em relação à qualidade das obras de construção das nossas infraestruturas públicas. Convém recordar que este não é um assunto novo e nem sequer é assunto apenas desta governação. Este assunto já tem barbas brancas e vem sendo falado desde há muito tempo, tendo passado por diversas etapas.
Durante anos, umas das etapas que atravessou a construção das obras públicas foi o abandono. Um pouco por todo o lado no país, viam-se obras inacabadas, não concluídas, sobretudo escolas e hospitais. O Estado, que é o dono dessas obras, através dos diferentes directores provinciais, chorava para localizar os empreiteiros, que os fitavam e não apareciam. O dinheiro? Eles já o haviam recebido na totalidade, sem muito esforço, no momento da deslocação dos equipamentos para iniciar a construção e já o haviam dividido na rede de corrupção.
Até que se tomou a medida de cadastrá-los para saber quem são efectivamente os nossos empreiteiros. Depois lhes disseram que se abandonas uma outra, por exemplo, em Chinginguir, em Inhambane, não vais conseguir a adjudicação de uma outra obra em Chiconono, no Niassa. Essas medidas retraíram bastante este modus operando dos nossos empreiteiros.
Ao que nos parece, nestes dias, o que anda na moda na construção das nossas infraestruturas públicas é a má qualidade. Obras construídas quase de qualquer maneira. À vista solta, tudo parece estar nos conformes. Tudo parece estar bem. Mas quando testados os materiais, vê-se logo que nada está bem. Foi gato por lebre. Muitas vezes, o que testa estas obras são os fenómenos naturais, vendavais e tempestades. A fiscalização, que devia ser ela a fazê-lo, assobia para o ar e não é tida nem achada, porque está em compadrio com quem constrói. Uma escola e um hospital voam. Ao lado está uma construção particular que resiste a tudo de modo sereno.
Em visita esta semana a Inhambane, o Chefe do Estado disse a bom tom para quem o quis ouvir que não faz sentido que o ciclone Dineo tenha destruído apenas escolas e hospitais e não casas na comunidade. E acrescentou: “não podemos continuar a despender dinheiro pra reabilitar edifícios que nem sequer têm cinco anos. Os poucos recursos que temos, são para construir e não para reabilitar”.
Aliás, o Presidente começou este discurso quando visitou o próprio Ministério das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, onde criticou a fraca qualidade das obras públicas e pediu que a fiscalização fosse mais agressiva. “Há pequena chuva, cai tudo, há ventos fracos, voam zincos. E porquê é que não voam coberturas feitas há 40 anos?”, questionou.
Os especialistas da área dizem que além da corrupção que grassa a área e a falta de fiscalização adequada, os projectos que são apresentados para a construção dessas infraestruturas são tão fracos, com fraca qualidade técnica, que precisamos de repensar como são formados nas universidades muitos dos nossos engenheiros de construção civil. Então, mau projecto e mau resultado final.
Neste sector, também se fala muito dos jogos debaixo da mesa, entre os empreiteiros, a fiscalização e também os representantes do dono da obra. Eles escondem o jogo, não querem que seja visto, evitam, o mais possível, andar nas bocas do mundo. Com o correr do tempo, hábitos e companhias, já são capazes de bater os passeios das avenidas, com o à vontade de quem bebe um copo de água em dia de canícula. Sem pingo de vergonha! Há assim por dizer, mil e uma maneiras de se prostituir, sem dar nas vistas, com elegância formal e ser respeitado pela sociedade bem pensante.
Nesses ambientes, a corrupção medra como cogumelos, porque o terreno lhe é propício. Navegamos no rio do deixa-andar mais pachorrento. Só que, quem deixa andar, é o próprio Estado, que assim se torna directamete responsável pelo caos que toda esta situação provoca.
Já é costume, nestas como noutras circunstâncias, arranjar desculpas esfarrapadas do tipo não temos recursos materiais e, por isso, vamo-nos arranjando com a prata da casa, com o que temos à mão, por isso as obras não resistem às intempéries, por isso as obras não duram como deviam durar, por aí em diante.
No caso em apreço, esta prata fica-nos tremendamente cara, não só pelas reparações que exige, pelo tempo que consome, pelos recursos humanos que empata, pelo péssimo desempenho que causa prejuízos enormes ao cidadão e ao próprio Estado.
Talvez seja esta a ocasião para chamar a atenção do Estado para a capacidade desculpabilizante de que, por vezes, os responsáveis pela construção dessas infra-estruturas dão mostras. Os materiais que são usados nestas obras, onde é que são testados? Quem dá a garantia de que de facto preenchem os requisitos de qualidade exigida. Quem recebe estas obras sem mandar uma entidade independente vistoriar. Estas e muitas outras questões deviam ter resposta consistente, sob a pena de que, se não se fizer nada, teremos mais episódios como aquele da queda do muro da piscina da Vila Olímpica,
Até quando teremos de assistir, impávidos e serenos, a semelhantes desmandos?